Subido por Reimix Forever Dezzy Sambocano

O SOL DE INVERNO

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Sou o que sou porque, assim, a vida me tornou!
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Autor: Rolando Beatriz Rodrigues.
Email: [email protected]
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Watsapp: +244 936187757
Editado por: Rolando Beatriz Rodrigues.
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É expressamente proibida a reprodução desta obra por qualquer meio que for sem
a autorização obvia, clara e precisa do autor. A violação desta proibição
ascenderá ao procedimento judicial, tal se estipula no código de direitos autorais e
de conexos direitos.
1ª edição.
Lunda-norte, Angola, 2020
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SINOPSE
Um livro escrito co' amor e ternura, expressando a arte poética que ensopa nas
vastas terras de África, nos palancas de Angola e, particularmente, nos diamantes
da Lunda-norte.
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AUTOBIOGRAFIA
Sou Rolando Beatriz Rodrigues, literalmente conhecido como Robero, — que é
meu pseudônimo — nascido entre o sabor de peixe, com as folhas de matamba e
a fidelidade de cima (chima), no cair do sol do dia 11 de Março de 1998, no meu
adorado município: Cambulo, província da Lunda-norte. Filho de Amador
Rodrigues António e de Quissamba Beatriz Nila. Estudante do Ensino de Língua
Portuguesa, na Escola Superior Pedagógica da Lunda-norte (ESPLN).
Sou membro oficial e coordenador do movimento literário predominantemente
Arcadismo (arcádia), com sede no Cambulo, cuja existência data-se desde os anos
2015.
Participei em variadíssimas actividades poéticas que, actualmente, a mais recente
é a “Flores em Quarentena”, publicada electronicamente em Maio de 2020.
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Se for para transformar o mundo, transforme-o, apenas não deixe que essa
transformação mude o amor que nasce no lindo sorriso dos dentes que beijam a
língua da sua boca.
AGRADECIMENTOS
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Primeiramente agradeço a Deus, criador dos céus e da terra, pela vida, força e
sabedoria que me tem dado. Agradeço, logo, aos meus pais: Amador Rodrigues
António e Quissamba Beatriz Nila, pela vida e educação que me deram e por
cuidarem de mim sempre que necessário. Agradeço, também, à Isabel Cavalo,
meu anjo, pelo apoio que me tem dado a cada novo dia. Ao mestre Sá (Osvaldo
Augusto de Sá Ngalula Rodrigues), de pseudônimo Saturno, por mostrar-me um
dos melhores caminhos da vida: poesia, isto no Arcadismo. Ao Samuel Bolivardo
dos Céus, por ser aquele suporte de que se precisa. Ao Estefânio José Cassule, meu
futuro professor universitário, pelas dicas básicas e frutíferes, porém necessárias.
Ao Adriano dos Santos Geovani, pelo apoio técnico. Aos eternos mestres Suslov
Cabongo (Yuri de Piedade), Paulo Muanda e Domingos Richard pela revisão desta
obra. — Sem vós isso não teria surgido em perfeitas condições. — Para culminar,
agradeço a toda arcádia e a todo mundo que directa ou indirectamente me
apoiou. Longa vida a todos!
DEDICATÓRIO
Dedico este livro, primeiramente, aos meus pais, por tudo que me têm feito até
hoje. A
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PRÓLOGO
O Sol de Inverno nasce de um momento de inspiração, um momento em que uma
luz no fundo do tunel brilhou seu brilho e com esse brilho iluminou meus passos e,
em seguida, fez-me renascer como poeta e nascer como escritor.
Está dividido em quatro grandes acontecimentos: A Dolores, — que tem um total
de dezaseis poemas escritos em sonetos roberianos (com versos undecassílabos no
primeiro, sexto e undécimo verso) — Não foi minha intenção amar-te, — que,
seguindo a lírica roberiana, compõe-se de quatro poemas — Cartas e diálogos a
São João — que tem um total de nove poemas — e, finalmente, Era uma vez, que
se compõe, por sua vez, de cinco poemas.
Leia calmamente cada grafema deste livro e viage comigo, o autor deste livro, até
onde se não chega humanos.
Boa leitura!
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O SOL DE INVERNO
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INDICE
A Dolores.................................
Não foi minha intenção amar-te.........
Cartas e diálogos a São João...............
Era uma vez.....
Autoretracto......
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Leia-me, mais que nobérrimo leitor!
No calar da noite que desampara,
pois nestes versos escritos co' amor,
estão todos segredos da minh' alma.
Leia-me, e sinta também esta dor,
que senti em cada gemer desta palma
com que compus estes versos sem cor,
e que co' eles arco-íres não compara.
São versos de amor e versos de paz,
e que tos dedico sem medo algum,
inspirados p'la Dolores, minha amada.
Mas se algum dia já não for capaz
de te causar sentimento nenhum,
Jogue-os, pois, dê p'ra levar a fada.
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A DOLORES
A DOLORES (1)
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Minha querida, minh' amada Dolores,
de tão pouquíssima idade somente;
tão bela, tão perfumada que as flores,
Co' o semblante atraindo veemente.
Dos afáveis lábios com mil sabores,
co' os olhos castos, olhar meigo, inocente,
fazes-te cura a mágoas (cura a dores),
e a mim fazes sentir que ninguém sente.
És tão rubra como eclipse solar,
brava como vulcões e densas chuvas,
e tão calma como adormecer do mar.
E as proezas que fazem tuas curvas,
Qu' eu, simplesmente, morro a viajar,
são tão doces que mista de mel e uvas.
A DOLORES (2)
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Bendita hora que com a sua nobreza
fez com que apenas minha você seja!
Uma união forte, e com sua pureza,
Fez-te musa de que se tanto almeja.
Bendita seja a verde natureza,
que me dá a lua para que nela eu veja,
como as estrelas, com tanta beleza,
ser como você, cada uma deseja!
Bendito o campo que sou oriundo,
por me ofertar de tão delicioso:
este presente que se guarda profundo!
Pois além da vida, um bem precioso,
a melhor coisa deste horrível mundo
é amar-te sempre, terno e atencioso.
A DOLORES (3)
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Olha, amor, esta pequena garrafinha
verde-negra, sobre a mesa pousada,
coberta à pele, também à massinha
Co' a sua tampa azul toda rousada.
Olha ela toda tão sútil... ousada!
Tão robusta igual àquela que mantinha
novíssima, limpinha e bem pousada,
a primorosa musa: vovó minha.
Abra-lhe a sua tampinha, é porção!
Coloque na boca tudo que há nela,
beba-a, pois, no ritmo duma canção.
É um veneno, mas vale bebê-la,
pois além de afligir o coração,
torna-te, entre mulheres, a mais bela.
A DOLORES (4)
18
Mais esbelta que relíquias e jardins;
suave que as águas e a natureza;
calma, doce, pura que mil jasmins;
obra 'sculpida a perfeita destreza!
os teus olhos — que cheiram a marfins —
são sinónimos da palavra beleza.
Não existe o que lhes sejam afins,
nem as deusas em sua realeza.
Pois revelam os teus profundos túneis,
em que a cada noite sou condutor,
que o sol, a lua, todos são coisas fúteis,
que as artes de ser perito amador, —
embora a muitos pareçam inúteis —
valem-me eternidade em teu amor.
A DOLORES (5)
19
Revela tanto o teu corpo, menina,
Orvalhos iguais a uma acesa vela;
Lua, sol e a chama que desatina
A cada, o brilhar em ti se revela.
Na tua boca nasce a vitamina,
De que se faz a rosa doce e bela;
O teu rosto, a tua face divina,
Beija-me o pensar, agrada-me vê-la.
E se não fizesse Zeus natureza, As estrelas neste mundo brilhar Teu olhar brilharia a sua beleza...
Roubando-te rubi, marfim, nobreza,
Ilídimo, como o azular do mar,
Zeus, criador, fez a sua realeza.
A DOLORES (6)
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Numa rua morta, infernal e calada,
que co' ela já nos abraçava o frio,
perto duma vila calma e abalada,
onde só se ouvem as vozes do rio,
Deste-me, sobre flores da calçada,
um forte abraço, que ao recordar sorrio,
minh'alma, sobre tuas mãos caçada,
Fez-se quente, tal os versos que crio.
Aquele abraço, oh menina mais bala!
Que estimula, naquela negra rua,
fez-me dizer o que já não mais se fala;
fez-me, num piscar, habitar na lua;
revelar um querer que já não cala,
dum simples abraço, virgem e crua.
A DOLORES (7)
21
É que se pudesse eu, minha formosa,
tocar-te como se toca um violão,
com os dedos trêmulos duma idosa,
tocar-te-ia co' a paz dum vilão...
Ou se pudesses, minh' alma 'morosa,
sentir como reluz o meu coração:
tão ríspido que o murchar duma rosa
entenderias que és constelação.
Como te és assim: branca de vaidade,
achando que sou mero enganador,
que te jura amar por toda eternidade,
far-te-ei consolo p'ra minha dor,
pois a mim, doce musa, és a beldade
que de a tanto amar tornou-me amador.
A DOLORES (8)
22
Tu que pareces ser inexistente!
Tu que o semblante de sol tem a cor!
De te olhar assim, tão indiferente,
encontro a paz, sossego, encontro amor.
Tens no peito a grandeza do senhor!
Tens n'alma toda pureza existente!
Em teus lábios tenho um beijo melhor,
em teus braços um colo diferente.
Quem te olha profundo, doce menina,
não vê simplesmente como és tão leve,
mas vê, também, como tu és tão divina...
como tens o que a Monalisa não teve:
um corpo perfeito e alma cristalina,
e como és pura, tão branca que a neve.
A DOLORES (9)
23
Que me tire a vida se ainda a tenho,
o senhor que dá, conquanto a retira!
Se disser que dos campos onde venho,
nada, do teu lindo rosto, se inspira.
Pois Da Vinci pintou como uma lira,
Cavalo Alado; e, com brilho e resenho,
pintou Monaliza, que o mundo admira,
e que diz ser tu, porém, em desenho.
Inspiraste a ser verde a natureza;
Quente o fogo e azul o vasto mar;
Só c'uma parte de tua beleza.
Outra, porém, é flor, talvez pomar,
que agrada aspirar, — p'la sua pureza, —
regar, cuidar e para sempre amar.
A DOLORES (10)
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Se você soubesse, meu doce amor,
Que te ter de novo tanto almejo
Porque não há mágoa nem dor maior
Igual a que sinto, se não te vejo.
Se você soubesse, meu bem melhor,
Como sangram-me os olhos de desejo,
Quando a chama de tal amarga dor,
Prende-me para longe do seu beijo.
Toma-me em conta para qu' eu não morra
Livra-me deste sofrimento interno
Que, como a luz, me mata sem demora!
Pois é um castigo viver este inferno,
Que se me aquece enquanto me devora,
Congela-me como o frio do inverno.
A DOLORES (11)
25
Como vês da nova noite o nascente,
assim são os dias contigo, amor:
frios como gelo, e como o sol, quente,
que longe de ti se revest' em dor.
Como vês da terra vasta o semente,
assim é cada noite sem ti, amor:
calma, seca, já quase inexistente,
que depois de chuvas se faz em flor.
Assim é, pois, a dor que sinto agora,
tão pesada que se não se suporta,
tal nostalgia que tanto devora...
tal dor que corrói sem bater a porta,
tal mundo que se desaba sem demora,
é a saudade, amor, que me tanto corta.
A DOLORES (12)
26
Quando pela manhã já me acordava,
olhava ao sol brilhante que sorria...
Hoje me esqueci do sol que brilhava;
esqueci-me até do próprio dia.
Esqueci-me de que eu te amava;
de que era eu poeta e tu poesia.
Esqueci-me da distância que eu dava,
e que co'essa distância tu morria...
c'um nostálgico descontentamento,
de recordar e o contrário fazer,
que hoje me vejo neste firmamento.
E o que me alegra, no entanto, é saber,
que de tão forte é tal esquecimento,
jamais e nunca me fez te esquecer.
A DOLORES (13)
27
Em teu jovem rosto e de pouca idade,
co' o que criou Deus tudo na natura,
rende-se o sol, perde toda claridade,
lua anoitece, e apaga, e fica escura.
Com o teu santo riso e sem maldade,
inspira-se a terra, por isso é pura,
e por ser a fonte da paz, beldade,
ao morto é vida, ao mórbido, cura.
Quem te olho, oh menina doce e bela!
Nesta vida, nesta vasta imensidão,
e diz que não lhe agrada tanto vê-la?
Se os teus retratos, o céu guarda e zela,
e co' os teus olhos, co' o teu olhar senão,
criou Deus a terra e tudo que há nela.
A DOLORES (14)
28
Eu sei bem que se atreve o coração,
Pelo impossível tanto enamorar,
E que tão fácil beija a decepção,
Se tal amor o tanto devorar.
Mas se me permitir essa paixão;
Dou-te mil versos pra te namorar!
Dou-te meu teto, dou todo meu chão
E meu coração pra nele morar.
Dou-te lembrança que se não olvida!
Dou-te mesmo antes de você sumir,
Aquela página que não foi lida.
Dou-te o bater do meu peito; meu sorrir!
Dou-te minh'alma, meu ser, minha vida
E meus beijos todos se permitir.
A DOLORES (15)
29
Criou Deus a luz no primeiro dia,
depois das águas fez separação.
A luz era bela como a poesia,
águas, vastas como a constelação.
Estava a terra sem forma e vazia,
no primeiro dia da criação.
Depois fez Deus tudo que não havia,
e à terra seca chamou Deus porção.
De lá que surgiram a terra pura,
a lua, o sol, aves de toda a cor
e mais mil espécies de criatura.
Mas o que fez Deus de ainda melhor,
entre todos os seres na natura,
foi criar você, meu eterno amor.
A DOLORES (16)
30
Naquela noite, sem sal nem sabor,
Que te tenho como sonho, um que é teu...
Onde, mesmo inda me chamando amor,
Beijaste-me os ombros, disseste adeus.
Naquela noite amarga, rica em dor,
Que, cruelmente, escureceu-me os céus...
Deste-me um abraço cheirando a flor...
Trancaste, em seguida, a porta... Mas eu,
Vendo p'la janela, única que tem,
Teu semblante, que é minha poesia,
Fluir-se de mim, com ira e desdém...
P'ra bem longe te ias, minha alegria,
Aos braços de quem te agora convém:
Odeio-te, assim como amei-te um dia!
A DOLORES (17)
31
És obra-prima tão bem esculpida,
Meu guia nesta serena aventura,
Mulher angelical, pura e divina,
Conjunto de artes, és literatura!
.
Tens um doce olhar, uma face tímida,
Um rosto prestante, uma boca pura,
Um andar sólido de mulher ríspida,
Conjunto de artes, és literatura!
.
Nascem flores numa boca que é sua,
E dum olhar que os anjos fez senhor;
Pois do teu peito fez-se o sol e a lua,
.
Da tua cruel raiva fez-se a dor,
E duma alma tão pura que é a tua,
Fez os céus algo tão melhor: o amor!
A DOLORES (18)
32
Olha, musa, como estou t'almejar!
Olha como já ninguém me consola!
E neste medo que no peito rola,
Desejo-te tanto e a tanto te amar!
.
Mas se não te posso assim desejar,
Que me seque a boca que não se cala!
E que me matam a voz desta fala,
Para qu'eu nunca mais volte a falar.
.
E o meu coração sólido e prestante,
Que se perde neste amor inimigo,
Morra! E seu querer se faça cessante.
.
Pois é tão cruel, tão cruel castigo,
Minh'alma te querendo como amante,
E tua como apenas um amigo.
A DOLORES (19)
33
O que há nesta roseira, minha amada,
É um vazio, um silêncio, é sepultura,
Um sorriso que não vale a nada,
Uma longa torre de curta altura.
.
Um coração triste, uma alma quebrada,
É vela acesa numa noite escura
Uma dor intensa que mesmo tratada
Não amena, não acalma, não cura.
.
O que há, minha amada, nesta roseira
É um vasto campo, uma terra, um pastor
Um tentar duma lágrima derradeira.
.
Um sorrir quando se agasalha dor;
Uma verde terra igual da videira,
Um festejar que almeja o sofredor.
A DOLORES (20)
34
Que culpa tenho, rara jóia minha,
Em amar-te assim: tão sólido e tanto?
S'até formosa terra, minha anjinha,
Seu sorrir, ofertou-mo como encanto.
.
Por que jogas dores onde não tinha?
Por que preferes tanto o desencanto?
Se não te agrada morar nesta vinha,
Escute pelo menos o meu pranto!
.
Deixa-me proteger-te simplesmente;
Deixa-me, se não posso ser teu rei,
Ser teu escravo, teu guarda somente.
.
Pois só assim minha vida te darei;
E s'eu morrer, assim tão carecente,
Prometo ficar feliz lá onde irei.
A DOLORES (21)
35
Já nem sei que atributo hei-de dar-te;
Tu que és tão serena como uma brisa.
És talvez Júpiter, ou talvez Marte,
Um sorriso que dor nenhuma pisa.
.
És da terra perfeita obra d'arte,
Que mais inspira por se vestir lisa,
Que uniu cada cor que tem por parte,
Para o Da Vinci pintar Monalisa.
.
És o brilho que o sol nunca teve ante,
Que a natureza extingue, mas desiste,
E que fascina o mundo sempre avante.
.
Princesa alguma contigo resiste;
Acarretas o mais belo semblante,
Qu'em nenhuma parte da terra existe.
POEMA (22)
36
De ti sinto senão ódio à fundo,
Quando vejo em qualquer anoitecer,
Mil musas e beldades deste mundo,
Fazendo milagres acontecer.
.
Pergunto-me porque tinha de ser,
Querer uma musa, assim moribundo,
Por que justo tinha de conhecer,
Amar-te com um amor tão profundo?
.
Odeio-te como quem mata e salva,
Pois, além de seres minha beldade,
És coveira que meu ser tanto cava.
.
E o que jamais faz sentir piedade
É saber que por detrás desta raiva
Meu ódio por ti nunca foi verdade.
37
38
NÃO FOI MINHA INTENÇÃO AMAR-TE
1º POEMA
39
Sabes, quando te vi pela vez primeira,
Com o teu rostinho de anjo, sentada,
Lá, bem por baixo daquela videira,
Que alegre nela pousava azul fada
Eras bela, encantada e verdadeira,
Porém eu de ti não esperava nada,
Nem amizade, que se obtém primeira.
Mas já o destino tinha uma jogada!
E assim, fomos, já sem pensar sequer,
No céu, co' as estrelas, entrelaçados
E aconteceu que tinha de acontecer.
Tão felizes , com mil risos rasgados,
Co' uma paz, sem medo de se perder,
Fizemo-nos dois eternos amados.
2º POEMA
40
Hoje já não sei que farei comigo,
Sinto-me gelado, sinto-me frio,
Preciso de ti, preciso de abrigo,
Por que te foste, meu pequeno lírio?
Viver sem ti, menina, não consigo
Se eu soubesse que ficaria vazio,
Meu peito, se não estiver contigo,
Podia, pois, evitar tal delírio
Se tivesse percebido por mim
Que da morte início me 'stavas dar
E da vida, porém, apenas fim
Que teu coração 'stava em outro lugar
Não te teria amado tanto assim
Como se o mundo fosse terminar
3º POEMA
41
Agora, tão somente, sinto saudade,
De nós dois batalhando contra tudo,
Em meio de guerras e de ansiedade,
Eu ser mil armas, tu, fiel escudo.
Embora a vil boca da sociedade
falasse, a gente se fazia mudo,
sempre eternos f'lizes, que é raridade,
Por se ter, a gente foi tão sortudo!
Agora, tão somente, sinto a falta,
De nossas dez mil brigas sem cessar,
Se eu falava baixo, tu, co' a voz alta.
Ainda assim, em volta deste mar,
Saltava a gente onde ninguém salta,
Num amor, que só a gente sabe amar.
4º POEMA
42
Eu, tantas vezes, a ti perguntava,
Co' o sonho dalgum dia compreender
Por que a ti me estava a prender:
— O que você queria, o que esperava...
qual é nosso objectivo, que buscava? —
Mas você nunca me quis responder
Ou talvez eu que não te quis entender
Toda vez que sem parar me beijava.
Mas se bem antes pudesse notar
Que teu coração 'stava em outra parte
Podia ter corrido e me escapar
Apenas espero que me descarte
E que algum dia me vens desculpar,
Pois não foi minha intenção amar-te.
5º POEMA
43
S'eu soubesse já naquele momento,
Quando me estavas ainda sorrir,
Qu' eu só estava errado de pensamento,
Quando decidi te deixar partir!
Disseste-me mesmo antes de sumir,
Que há risos após som do desalento;
Que não vale deixar raiva vestir
A cor de pranto p'ra causar tormento.
Disseste-me que o tempo só devora;
Que inda vale ser aquele amador
Q' um dia amou-te forte e sem demora.
E eu, como quem tanto guarda rancor,
Disse-te, co' orgulho, p'ra se ir embora,
Quando apenas quis dizer: não vá, amor!
44
CARTAS E DIÁLOGOS A SÃO JOÃO
45
Iª Carta — DIÁLOGO (1)
Sabe, meu caríssimo padre São João,
estas cartas, nobérrimo, que escrevo, —
não me julgue, não me faça isso não,
pois escrevo tudo que ao peito levo.
Sei que pode o senhor achá-lo vão,
mas é verídico o que nelas descrevo.
Não é drama, sô padre, é confissão,
e contá-lo a ti, caríssimo, eu devo.
Foi numa noite, sô, tão virtuosa, —
acredite, a ti minh' alma não mente —
que conheci, sô padre, uma luxuosa.
E assim, sô padre, repentinamente,
enamorei-me pela tal formosa
de tão pouca, pouca idade somente...
46
2ª carta — DIÁLOGO (2)
Sei que pode o senhor não acreditar
no que digo, inda achar que é vaidade,
mas, se lhe conto esta minha verdade,
não minto, vale em mim acreditar!
É como em mil versos, dois a rimar.
Algo assim, nobre padre, é-me raridade!
Talvez é angústia, talvez moncidade,
estou, sô, descontrolado a ficar.
São coisas que não se pode explicar!
Coisas do amor, filho, são mesmo assim.
Ame tanto, tudo que der para amar,
mas acredite, filho, acredite em mim,
que esse amor, co' o tempo se vai gastar,
porque todo início sempre tem fim.
47
3ª carta — DIÁLOGO (3)
Eu não quero, sô padre, que seja assim:
beber da vida um amor começado;
achar que encontrei algo para mim;
notar que está tal instância acabado.
Eu quero, senhor padre, eu quero, sim,
cada momento viver ao seu lado,
Ser minha flor, — doce flor — meu jardim,
E eu, sô padre, ser apenas seu amado.
Eu quero somente felicidade;
quero sorrir um riso de alegria;
quero simplesmente amá-la de verdade.
Se não bastar p'ra impedir agonia,
quero viver, viver a eternidade,
p'ra dar-lhe um beijo de que é poesia.
48
4ª carta — DIÁLOGO (4)
Não é que eu não queira que seja feliz,
não tenho, filho, não tenho tal dom,
apenas digo pelo que você diz:
amor é cruel, mas é muito bom.
Amor perfura onde há já cicatriz,
entretanto sara com o mesmo tom.
Deixa-me contar-te o que nunca fiz,
Apenas me ouça co' essa voz sem som.
Uma das coisas que me tanto espanta
É amar por anos a mesma mulher
Eu que de formosura tinha de tanta.
Por isso vês que nada me espanta
Porque na vida é preciso escolher
Qual pecadora se quer fazer santa.
49
ERA UMA VEZ
50
POEMA (01)
Era uma vez, numa dada cidade,
Morava um menino, c'um passarinho,
Ambos bebiam sua mocidade:
Um na sua casola, outro no ninho.
Passaram noites, - uma raridade Foi-se longe da vida o rapazinho,
Que, mesmo tendo sua pouca idade,
Tratava o passarinho com carinho.
Viveu, então, passarinho sozinho,
Com uma culpa colada no peito,
Pois ao seu dono não disse 'adeusinho!'
Cada segundo tornou-lhe despeito,
Pois além das flores em seu caminho,
Faltava-lhe o rapaz, seu doce leito.
51
POEMA (02)
Era uma vez, na minha moncidade,
passeavamos eu co' a minha amada
entre as esquinas da nossa cidade,
felizes, contentes e de mão(s) dada.
Quando, mas de tão pura raridade,
entre esquinas onde não se vê nada,
vimos de longe, alguém de tanta idade:
uma velhinha, que estava sentada.
Sem medo, avaçamos à caminhada
quando, de repente, nos disse a velha:
Caminhem, jovens, se amem tempo a cada
Pois o amor é como óleo na fornalha:
Se mais demora, mais seca e acaba,
Depois se esfumaça, depois se espalha.
52
POEMA (03)
Um Príncipe aos rochedos sentado,
Alguns quilómetros da beira-mar,
Estava de pensamento calado
Procurando sua dor acalmar.
Após o dia já quase acabado
Levantou-se de rocha e foi ao mar
Pra ele confessar que não era amado
A uma musa que não o quer amar:
E o mar dormente pós-se a perguntar:
O que queres, Príncipe, me falares
Que não podes ao menos esperar?
E disse o Príncipe após mil falares:
S'um homem não pode de facto amar,
Então, mar, peço para me levares.
53
VERSOS TRANSCENDENTES
AMOR — CHAVE DO CORAÇÃO
54
Ame a vida enquanto estiveres vivo;
Pois a vida é so vida quando é vivida;
De tal a paixão vive sendo sentida;
Guardái a vida num só arquivo.
É preciso refletir mais vezes que puder;
Pois o tempo vai e não regressa;
De tal a dor sem motivos não ingressa;
O Amor é o libido que nos dá poder.
Se quiseres ame, se não, não o faça;
Amar sem a sinceridade machuca;
Lembro-me do que disse o São Luca;
Só o Amor verdadeiro não tem raça.
Então ame, ame, ame, ame e ame...
Ame cada vez mais, ame diariamente;
Viva amando, dê amor a um só ente;
Pois o amor é único e até os ódios o chame!
SOLIDÃO
55
.
Oh senhora minha! Oh minha senhora!
Tu que dominas o meu corpo todo,
E que se esforça, e que não melhora
Seu ego masculino nem seu modo.
.
Como um livro que se tanto desfolha
Mesmo sem ser lido nem acabado,
Digo-te que jamais és minha escolha!
E por ti eu não desejo ser amado.
.
Vênus, durante anos, amou seu amor.
Mnemosine, a mãe das seis medusas,
Também amou sem receio e clamor.
.
Camões, romancista das águas lusas,
amou. E eu, que sou desconhecedor,
Por que não posso ter comigo musas?
SONETO DE CIRCUNSTÂNCIA
56
Uma chama sobre a fechada porta,
Acende aos meus olhos castos, brilhantes
Uma luz branca, que ninguém suporta,
Se envaidece, tal como fazia antes.
.
Um silêncio triste da noite morta,
Pediu-me calmo: levanta, cantes!
E eu, co'aquele ânimo que tanto corta,
Enxotei-o e tantas luzes restantes.
.
Ficar na sombra é também poesia,
Que resulta de tão pouco falar,
C'olhos vedados, aguardando o dia.
.
Pois não se pode, de facto, cantar
Mil músicas com rítmo e melodia,
Se não se tiver público a espantar.
AO VINHO
57
Trago-te no peito e nesta sant'alma,
Agradável, prestante, doce vinho;
Tomo-te vagaroso, c'uma calma,
Num cristalino e dourado copinho.
Trato-te bem, e com todo carinho,
Pois só tu, meu vinho, só tu m'acalma;
Com o teu cheiro d'uva em minha palma
Qu'embriaga meu ser devagarinho.
Tu, doce vinho, és nosso protector!
E afirmou Bolivardo que és marfim;
E afirmo, pois: és nosso eterno amor!
Cuida, doce vinho, cuida de mim!
Cuida deste teu fiel bebedor,
Que te promete tomar até ao fim!
REFLEXÃO
58
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Às vezes, e como é próprio do mundo,
A gente comete erros sem saber,
Apunhalamos almas bem no fundo,
Acabamos indo sem perceber.
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Com isso, magoamos bem profundo,
Milhões de pessoas, e sem querer,
Metemo-nos no tenebroso imundo;
Onde desejamos senão morrer.
.
Procuramos tanto nos desculpar
E a desculpa que nem sempre nos dão
Serve somente para nos culpar.
Por isso vimo-nos na imensidão
Deste infernal mundo um dia mudar
Com a magia dum simples perdão!
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AOS [KAN]DENGUES.
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Quando vão, contente, jogar a bola Uns preferem assistir aos bonecos,
Outros nem importa ficar aos becos Levam, cada um deles, uma sacola.
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Uns correm daqui e dali; outros à escola
Uns dão judos; mortales - tais de recos E alguns que se contentam de seus ecos
Vão num poço e gritam, e a voz decola.
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Viver como alguns kandengues é estar
Contemplando sorrisos sem riqueza
E ver, a brincar, o tempo passar.
.
É crescer, sonhar, dormir e acordar
Beijando a boca da mãe natureza
E prometer à vida sempre amar.
60
UM SONETO
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Sabe, mãe, nesta triste e cuel vida,
onde ninguém ouve mesmo que fales,
onde a maldade rega os seus males,
por tão simples erro que é cometida.
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Sou senão uma página não lida,
ou retrato de pequenos entalhes
dum livrinho que resume em detalhes
um pouquíssimo de minha partida.
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Que me valha vezes a persistência que durante anos sorrio-me à dor à cruel razão da minha existência!
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E que brilhe a dor que me roe a cor!
Pois nesta vida não há-de excelência,
que viver com ternura e com amor.
POR QUATRO ANOS
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61
Conheci-te simplesmente,
Sem mil detalhes nem norte;
Quem guiou-me foi a mente,
Este que é meu ponto forte.
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Daí assim tão diferente,
Senti-me com muita sorte,
Como a sorte de quem sente,
Sua vida a beijar morte.
.
Meu coração pra mim disse,
Para eu ir te conquistar,
E que quando o sol se abrisse,
Você não mais lá ia estar.
.
Fiz de tudo pra que risse,
Do que te estava a falar,
Até desejei que visse,
Quão não queria calar.
.
Mas estavas tão tranquila,
Bem ali no teu cantinho,
62
Pensei em ir tomar tequila,
Só pra cruzar teu caminho.
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Fiquei fazendo mil planos,
De como eu te possuir;
Me embriaguei por dois anos,
Por descuido deixei-te ir.
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Foi doendo cada não,
Que deste-me sem pensar,
Senti-me simples anão,
Sonhando recompensar.
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Mas era forte este amor,
Que tanto sinto por ti,
Que fez-se livro de dor,
Cujas folhas nunca li.
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Quando amor é verdadeiro,
Se acelera o coração;
Mas se for traiçoeiro,
Bate como uma canção.
63
.
Uns bilhões de horas depois,
Que decidi te enfrentar,
Quando teclamos só os dois,
Disse: não custa tentar!
.
Declarar-se não é fácil,
Pra uma musa desejada;
E você como é tão grácil,
Fiz-te logo minha amada.
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Porquê de eu comemorar
É mais que fácil saber,
Pois te estou a namorar,
E não te quero perder.
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Mas se Deus nos separar,
Que seja, pois, mesmo assim;
Porque eu juro, vou te amar!
Com um amor, e, sem fim.
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TEU SORRISO
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Não há de tão brilhante, neste mundo,
Que teu esbelto e aprazível sorriso
Nem o silêncio alegre do mar fundo
Nem o deslizar num gelo tão liso
.
Teu sorriso é desejar tão profundo
O falar vistoso de um triste riso
E buscar em cada nota do rundo
Batidas d'Áfrika que há tanto piso.
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Teu sorriso, que pra todos convém,
É uma bênção, é luz, é uma alegria
E tem um brilho que nem o sol tem
.
Teu sorriso é música, é melodia
E quem saber aproveitá-lo bem
Verá que além de vida, é poesia.
UM DIA VOCÊ PERCEBE!
Você percebe um dia,
65
Que tudo vale nesta vida,
Que cada pedaço de alegria
É só uma página em nós contida.
Um dia você nota
Que apesar de sofrimento
A luz sempre brilha
E a noite cai no esquecimento.
Um dia você percebe
Que apesar de qualquer dor
As risadas que você recebe
Valem igual vale o amor
Um dia você cairá,
E pedirá misericórdia,
Noutro dia levantará,
A sorrir victória.
Assim é a vida,
Tão curta e amena
Mas se a souber aproveitar
Verá que vale à pena
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AUTORETRACTO
POEMA (1)
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Sou destas ruas simples menininho,
Morte sanguínea, guerra, sou terror,
Sou mais doce, mais suave que vinho;
Um ser cruel, recheado de horror.
Sou talvez um pequeno passarinho
Que nada orgulha senão beijar dor,
Pois, cada pétala no meu caminho
Revela mágoa, não revela amor.
Um rei sou, mesmo sem ter realeza!
Pois para nada me vale esta vida,
Que me oferta senão sua dureza,
Que minh'alma deixa toda partida
E que me faz, como faz natureza,
Uma página branca, mas já lida.
POEMA (2)
Eu sou lembrança de quem não existe,
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Sou talvez um triste sonho de alguém,
O vazio que restou quando partiste
Aquele que tem tudo, e nada tem.
Sou aquele riso que não me riste,
Quando da vida te foste p'ra além,
Sou o que te olhou, e não me viste,
Que além da vida, partiu também.
Sou o sentimento que ninguém sente.
Sou um gelo frio, uma chama quente,
O que anda,... anda,... nem sei onde vou!
E desta incerteza que tenho à mente
De ser vida p'ra nenhum ser vivente
Não sei de certo dizer o que eu sou.
POEMA (3)
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Sou bicho guerreiro, pura pantera!
Sou das águas difícil de acalmar!
Sou, p'ro fogo e vulcão, calmo mar!
Sou conjunto de males desta terra!
Sou tigre do verão, da primavera!
Sou de cuja alma se vai sem chamar!
Sou capaz de tudo, capaz de amar!
Sou devorador, cruel de primeira.
Sou compositor, e sem nenhum tema!
Sou aquele que colhe o que semeia!
Sou do mundo a morte, mágoas, dilema!
Sou de cujo sangue não passa à veia!
Sou frio, e tão quente com'um poema!
Sou, portanto, lobo à minha alcateia!
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71
FIM
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