Revista Eletrônica Novo Enfoque, ano 2013, v. 17, n. 17, p. 196 –201 DOENÇA RENAL CRÔNICA TERMINAL EM HEMODIÁLISE: MUDANÇAS DE HÁBITOS E DOENÇA ÓSSEA COSTA, Cláudia de Almeida¹; CANDIDO, Kézia de Jesus¹; FILHO, Alfredo Maio2 ; SOUZA-LEMOS, Camila 2 ¹ Acadêmicos do PIBIC&T/UCB (Vigência: Out./2012 a Out./2013). Curso de Biomedicina da Universidade Castelo Branco (UCB), Campus Realengo, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. ² Professores e Orientadores do Curso de Curso de Biomedicina da Universidade Castelo Branco (UCB), Campus Realengo, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Palavras-chave: Insuficiência Renal Crônica, Hemodiálise, Doença óssea, PTH, Mudança de hábitos alimentares. Introdução Os rins executam o principal papel do sistema urinário. Eles, além de eliminar os materiais indesejáveis que são ingeridos pelo corpo, têm a função de controlar o volume e a composição dos líquidos corporais, mantendo o ambiente das células estável para realização das suas funções como a excreção dos produtos indesejáveis do metabolismo e de substâncias estranhas, drogas e produtos químicos.2 Atuam também regulando a pressão arterial secretando a enzima renina e o pH do sangue conservando os íons bicarbonato e excretando os íons hidrogênio na urina.1 O desequilíbrio dessas funções pode levar à insuficiência renal crônica, uma doença de elevada morbidade e mortalidade na qual os rins perdem a capacidade de realizar suas funções básicas, resultante da grande perda de número de néfrons funcionais. Essa perda é irreversível, lenta e progressiva, levando à doença renal terminal. O doente, então, será submetido à terapia de substituição renal, que pode ser a diálise (peritoneal ou hemodiálise) ou até mesmo um transplante renal, quando a funcionalidade dos rins estiver apenas entre 10% e 12%. Até que a doença tenha progredido a níveis avançados, não há sintomas que facilitam o diagnostico, sendo necessário realizar análises de dosagem da creatinina e da ureia no sangue e análises de urina. Quando os pacientes perdem mais de 50%, podem aparecer sintomas e sinais que ainda podem não ser incômodos.5 Uma das causas que levam à insuficiência renal crônica são lesões da vasculatura renal, que podem levar à isquemia renal e à morte do tecido renal.2 Entre outras causas, pode-se citar hipertensão arterial sistêmica (HAS), diabetes mellitus, doença policística renal, glomerulonefrites, infecções urinárias de repetição, cálculos renais de repetição, doenças da próstata, entre outros.4 Na insuficiência renal, os rins perdem a capacidade de excretar substâncias tóxicas do nosso organismo, levando à hiperfosfatemia e a uma estimulação maior da produção de PTH (paratormônio). O PTH é secretado pelas glândulas paratireoides, que são quatro pequenas glândulas localizadas na região posterior à tireoide. Esse hormônio é responsável pelo controle dos níveis de cálcio, fósforo e vitamina D no sangue, retirando o cálcio dos ossos, aumentando a eliminação renal do fósforo e estimulando a produção renal de vitamina D ativada. Porém, nos casos de IRC, o fósforo não é excretado na urina e nem há a produção de vitamina D. A eficácia do PTH consistirá apenas na extração de cálcio dos ossos, e somando com a insuficiência de vitamina D ativa causa-se uma grave lesão óssea, pois diminuirá também a absorção intestinal de cálcio, isso irá desencadear o quadro de osteodistrofia renal (ODR). O excesso de fósforo também se liga ao cálcio, o fosfato de cálcio, que leva a calcificação destes vasos, obstruindo o fluxo do sangue. Do ponto de vista histológico, a ODR apresenta uma espectro que varia desde a osteíte fibrosa (doença de alto turnover ósseo que está relacionada ao hiperparatireoidismo secundário – PTH) até a doença óssea adinâmica (DOA – principal representante do baixo turnover ósseo). As doenças ósseas em paciente com insuficiência renal crônica são decorrentes de alterações do metabolismo mineral.7 O aumento do fósforo, devido à diminuição de sua secreção, estimula as parateoides ainda mais aumentando os níveis de PTH, gerando o quadro de hiperparatireoidismo secundário. Ou seja, a hiperfosfatemia desempenha papel fundamental na gênese do hiperparatireoidismo secundário.8 Portanto, o hiperparatireoidismo secundário é frequente no paciente renal crônico, caracterizado pelo funcionamento excessivo das glândulas paratireoides, que aumentam a produção do hormônio PTH. O paciente que desenvolve tal condição deve seguir rigorosamente as orientações dos profissionais da saúde. Por isso, o paciente será submetido a uma dieta pobre em fósforo. Os principais alimentos ricos em fósforo que deverão ser evitados são: leite e seus derivados, panquecas e waffles, cereais e farelos, nozes, amendoins, amêndoas, chocolate, cacau, alimentos feitos com farinha integral (pão, bolos, bolachas, torradas), feijão, ervilhas, pizzas, biscoitos, sorvetes, iogurtes, refrigerantes à base de cola, cerveja, sardinha, salsichas, presuntos, linguiças, entre outros.4 Para o controle, deve-se fazer dosagem semestral de PTH e dosagem mensal de fosfato sérico. Tendo esses dados como base, a pesquisa teve como objetivo fazer um levantamento de dados laboratoriais destes pacientes e avaliação da adesão ao tratamento sugerido pelos médicos e nutricionistas visando à prevenção do desenvolvimento de doença óssea com a mudança de hábitos. 197 Procedimentos Metodológicos Foi realizado um levantamento de dados laboratoriais de 28 pacientes, relacionados aos níveis séricos de PTH de pacientes em hemodiálise na Clínica Renal Vida da Barra da Tijuca/RJ, durante o ano de 2012, e a avaliação da adesão ao tratamento dietético destes pacientes sugerido pelos médicos e nutricionistas, tanto para tratamento como para prevenção de doenças ósseas. O projeto teve início através de revisão bibliográfica, contato com a Clínica e acesso aos pacientes e seus exames laboratoriais, dependendo de alguns critérios de inclusão como: 1) Fazer hemodiálise, 2) ser portador de insuficiência renal crônica terminal, 3) PTH com nível > 300 pg/ml e 4) Idade > 18 anos. Após o contato com os pacientes e sua aceitação, foi realizado um questionário, com as seguintes perguntas: 1) tempo que faz hemodiálise, 2) se conhece a dieta para o controle do PTH, 3) se realiza dieta para o controle do PTH e 4) nível de escolaridade, cumprindo, assim, o objetivo da pesquisa. O questionário mostrou o perfil dos pacientes com insuficiência renal crônica em hemodiálise que conhecem e aderem ao cumprimento da dieta para o controle do fósforo, e as mudanças no cumprimento dos hábitos exigidos no tratamento da doença como restrição hídrica, dieta rigorosa e o uso adequado da medicação indicada pelos médicos e nutricionistas. E também aqueles pacientes que não conhecem ou não seguem o tratamento adequado, seja por falta de conhecimento ou escolha. Análise de dados Para este trabalho, foram selecionados 28 pacientes com insuficiência renal crônica em hemodiálise de acordo com as exigências citadas acima; no entanto, três pacientes foram excluídos por falta de exame laboratorial em 2012. Foram então colhidos dados de 25 pacientes, e os mesmos responderam ao questionário citado acima. A análise foi realizada a partir desses dados obtendo-se os seguintes resultados: CONHECIMENTO DA DIETA X PTH SÉRICO FIGURA 1.1. A maioria dos pacientes renais crônicos possui um bom nível de conhecimento sobre o tratamento, porém o gráfico mostra que os pacientes passam a aderir mais a dieta quando sofrem complicações do quadro clínico da doença. 198 CONHECIMENTO DA DIETA X TEMPO DE HEMODIÁLISE FIGURA 1.2. Os pacientes tendem a conhecer melhor a dieta quando sofrem por um maior tempo de hemodiálise. A hemodiálise requer 4 horas por dia, três vezes por semana e os doentes acabam criando vínculos uns com os outros, e o agravamento do quadro clínico de um pode influenciar o outro de maneira que o estimula a buscar maior entendimento sobre a importância da mudança dos hábitos ESCOLARIDADE X PTH SÉRICO FIGURA 1.3. Esse gráfico mostra a relação entre o grau de escolaridade e o nível de PTH sérico, evidenciando a importância da instrução, sobre as consequências que a doença pode causar e, assim, mudar seus hábitos alimentares, seguir a dieta e a medicação exigida pelo médico para a eficácia do tratamento. ADESÃO DIETA X PTH SÉRICO FIGURA 1.4. Diferente do gráfico anterior, que questiona o entendimento do doente, podemos constatar que o paciente que cumpre as exigências de maneira preventiva, fazendo a dieta, diminuindo a ingestão hídrica e de 199 fósforo, e mudando outros hábitos alimentares, passam a ter PTH controlado. Outros passam a fazer a dieta após a alta estimulação do PTH, devido à hiperfosfatemia. ADESÃO DIETA X TEMPO DE HEMODIÁLISE 30% 25% 20% 15% 10% 5% 0% FAZ DIETA NÃO FAZ DIETA T - 0 A 5 05 A 10 ANOS ANOS 10 A 15 ANOS > 15 ANOS FIGURA 1.5. A estatística nos mostra que, com o passar dos anos de hemodiálise, os pacientes têm conhecimento da dietoterapia; contudo, as razões de insucesso dos parâmetros de adesão declinam considerando a situação psicológica, social ou econômica. Discussão e Resultados De acordo com os resultados obtidos, pode-se concluir que os pacientes com IRC que possuem níveis normais de PTH conhecem e seguem às restrições alimentares impostas para o controle dos níveis de fosfato, mudança de hábitos e controle dietético rigoroso e hídrico, como mostra na FIGURA 1.1. E 1.4. Portanto, a resistência a essas mudanças está diretamente relacionada à doença óssea. Inicialmente eles sofrem com o impacto de saber que estão com uma doença crônica, que desencadeia mudanças na sua rotina diária, como se submeter à terapia de substituição renal, acarretando perdas e limitações por ser uma doença que agride física e emocionalmente o paciente e toda sua família. Com passar do tempo, eles buscam maior entendimento devido ao agravamento da doença (FIGURA 1.2). Pode-se evidenciar também que o grau de escolaridade é um fator diferencial para a capacidade de entendimento do problema devido à complexidade do assunto (FIGURA 1.3.). Apesar de o paciente ser responsável pelo seu tratamento, faz-se importante um trabalho em equipe, tanto dos profissionais, da família e dos amigos envolvidos. A dificuldade de adaptação, aceitação, razões de insucesso ou cansaço pelos anos de tratamento e sacrifícios ao longo da jornada que os privam de uma vida normal, pode leva-los a negligenciar o tratamento adotado pela equipe médica (FIGURA 1.5). 200 Considerações Finais Dentre as complicações apresentadas pelos pacientes com insuficiência renal crônica terminal, as doenças ósseas tem grande importância na morbimortalidade destes pacientes devido às alterações endócrinas relacionadas ao PTH e a Vitamina D. O aumento do PTH nestes pacientes está diretamente relacionado ao aumento do fósforo sérico e também ao grau de diminuição da taxa de filtração glomerular. Uma das maneiras de evitar o aumento do fósforo sérico e o consequente aumento do PTH está na diminuição da ingestão de fósforo pelos pacientes, o que demanda uma adesão do paciente a dieta prescrita pelo nutricionista. O desafio dos médicos e nutricionistas está no convencimento destes pacientes sobre a importância desta adesão. A realização deste trabalho visou a verificar a relação entre a adesão ao tratamento e o desenvolvimento da doença óssea, assim como os motivos para a não adesão necessária a uma maior eficácia do tratamento. Referências ¹ TORTORA, G. J. & DERRICKSON, B. Princípios de anatomia e fisiologia. 12 ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2009. ² GUYTON, A. C. & HALL, J. E. Tratado de Fisiologia Médica. 11 ed. São Paulo: Elsevier Ltda., 2006. ³ STEFENELLI, T.; ABELA, C.; FRANK, H.; KOLLER-STRAMETZ, J.; GLOBITS, S.; BEGER-KLEIN, J.; et al. Cardiac abnormalities in patients with hyperparathyroidism: implications for follow-up. J Clin Endocrinol Metab 1997;82:106-12. 4 PINHEIRO, P. Insuficiência Renal Crônica. Brasil: MD. Saúde, 2013. Disponível em: <http://www.mdsaude.com/2009/08/insuficiencia-renal-cronica-sintomas.html#comments>. Acesso em: 16 set. 2013. 5 MOURA, L. R. R. Insuficiência renal. São Paulo, SP: Sociedade Brasileira de Nefrologia, 17 set. 2013. Disponível em: <http://www.sbn.org.br/leigos/index.php?insuficienciaRenal>. Acesso em: 16 set. 2013. 6 RENNKE, H.G. & DENKER, B.M. Fisiopatologia renal: princípios básicos. 2 ed. São Paulo: LMP Editora, 2007. 7 REVISTA SAPIENTIA. Edição IV, vol IV, nº 4, ano 3. abril/2012. ISBN 2178 4019 8 CRUZ, J.; CRUZ, H. M. M.; BARROS, R. T. Atualidades em nefrologia. 1 ed. São Paulo: Sarvier, 2006. 201