A TEORIA DO CAPITAL HUMANO E SUA INFLUÊNCIA ECONÔMICA E POLÍTICA SOBRE A EDUCAÇÃO E O TRABALHO NO BRASIL NAS DÉCADAS DE 1960 E DE 1970 Jefferson Soares da Silva 1 Adnilson José da Silva 2 Resumo A relação entre educação e economia é inarredável. Ao longo da história da educação é uma constante a presença de discursos econômicos pautando e mesmo concebendo modelos pedagógicos vinculados a projetos de desenvolvimento. Neste contexto, este trabalho analisa o discurso capitalista, no âmbito da educação brasileira, apoiando-se na teoria do capital humano entre a década de 1960-1970. Para estruturar esse estudo foram utilizados elementoschave de natureza conceitual e factual. Entre os fatos históricos foram elencados movimentos e discursos do capital no sentido de criar espaços adequados à sua instalação e ao seu espraiamento. A educação, historicamente, foi vinculada aos propósitos da economia e, no Brasil, a partir da segunda metade do século XX as políticas educacionais foram concebidas para o modelo capitalista de educação, tendo na teoria do capital humano o seu conceito básico. O estudo observa a presença de modelos postos para a educação nacional em que não foram empregados referenciais humanísticos vinculados diretamente ao desenvolvimento e ao refinamento pessoal e político dos sujeitos educandos, mas sim, referenciais econômicos encontrados em um ranking de países organizado conforme o seu nível de desenvolvimento material. Este estudo não nega a necessária vinculação entre educação e trabalho, mas sim, apresenta uma crítica a um modelo educacional historicamente situado que divorciou o trabalhador da evolução pessoal e política que a prática do trabalho tem condições de proporcionar. INTRODUÇÃO A relação entre educação e economia é inarredável. Ao longo da história da educação é uma constante a presença de discursos econômicos pautando e mesmo concebendo modelos pedagógicos vinculados a projetos de desenvolvimento. Nesses casos se diz que as perspectivas educacionais, geralmente expressadas em forma de políticas públicas, são teleologicamente definidas por critérios econômicos. O que proporcionou um sentido teleológico para a educação voltada às demandas do capitalismo foi o conceito de capital humano. Para melhor compreender este conceito, convém observar que enquanto Karl Marx, através da interpretação da nova relação entre trabalho e dinheiro, chocava a Europa com obra O Capital em 1867, a revolução industrial 1 2 Mestrando pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: [email protected] Professor da Universidade Estadual do Centro-Oeste. E-mail: [email protected] 2 incutia uma visão diferenciada, apresentando o homem como indispensável ao novo modelo de produção capitalista, dando origem à idéia de recursos humanos ou capital humano (PONCHIROLLI, 2002). Dentro deste contexto, o processo de escolarização começa a ser interpretado como elemento fundamental para a formação do capital humano. Schultz 3 (1962, apud Paiva, 2001, p. 232) buscou conceituar capital humano propondo uma “[...] equação econômica da relação entre capital e trabalho”. Theodore W. Schultz, a partir de seu livro intitulado “O valor econômico da educação”, publicado em 1962, difunde, também para o Brasil, o conceito de capital humano. Segundo Paiva (2001), A educação passou a ser vista, simultaneamente, como o motor das “etapas do crescimento econômico” e do atendimento aos planos de desenvolvimento socialista. As próprias metodologias entrelaçaram-se por que métodos tipicamente capitalistas, como o da demanda social ou da análise custo benefício, passaram a ser usados junto com diagnósticos que pretendiam identificar não só a disponibilidade de força de trabalho qualificada, mas a demanda futura da economia, e projetaram as características do sistema de educação e seu output, de modo a poder propor modificações capazes de oferecer a qualificação necessária no tempo devido. Para tanto, o man-power aproach, método gerado nas economias socialistas, pareceu bastante adequado e não foram poucas as tentativas de combiná-lo aos demais levados a cabo nos 60 e 70 em diversos países capitalistas (PAIVA, 2001, p. 186). Sem se afastar da relação entre desenvolvimento econômico e educação, esse artigo analisa o discurso capitalista, no âmbito da educação brasileira, apoiando-se na teoria do capital humano entre a década de 1960-1970. O esforço empreendido nesse trabalho foi direcionado para o estudo de influências do capitalismo internacional na educação brasileira nas décadas de 1960 e de 1970, enfocando o discurso de apresentação da teoria do capital humano como fundamento e teleologia da pedagogia tecnicista. De maneira mais específica, tal estudo se realizou pela abordagem de aspectos históricos, econômicos e conceituais da teoria do capital humano, bem como o seu papel nas orientações econômicas aos países subdesenvolvidos no período mencionado; pelo enfoque na configuração da teoria do capital humano como princípio pedagógico e o direcionamento teleológico que deu à educação escolar brasileira; e no elenco de críticas ao modelo educacional/escolar pautadas pela teoria do capital humano e presentes na literatura, desde autores clássicos até contemporâneos brasileiros. 3 SCHULTZ, T.W. O valor econômico da educação. Rio de Janeiro: Zahar, 1962. 3 Para estruturar esse estudo no presente artigo, se tratará de elementos-chave de natureza conceitual e factual. Entre os fatos históricos serão elencados movimentos e discursos do capital no sentido de criar espaços adequados à sua instalação e ao seu espraiamento. Quanto aos elementos conceituais, o que receberá maior ênfase será o de teoria do capital humano. Para melhor situação da teoria do capital humano como elemento fundamental das políticas educacionais que foram implementadas no Brasil nas décadas de 1960 e 1970, é importante situar o caso brasileiro no contexto da economia internacional desde antes do período citado, após a Segunda Guerra Mundial, com especial atenção para os balizamentos econômicos dados por órgãos internacionais, como o Banco Mundial. CONJUNTURA ECONÔMICA NO PERÍODO PÓS-SEGUNDA GERRA MUNDIAL A análise das relações entre os países e seus diversos níveis de poder culminou no que recentemente chamamos de enfoque realista, que apesar de atual “[...] já sustentava a concepção política influência hemisférica, herdada do colonialismo” (FONSECA, 1998). Para corresponder ao jogo de interesses foi necessária uma estrutura que atendesse as necessidades das organizações mundiais. A partir de 1946 o Banco Internacional de Reconstrução e Fomento (Banco Mundial) informou a seus membros sobre o início de suas operações. À instituição cabia a missão, prédefinida, de auxiliar os países membros em sua reconstrução e desenvolvimento, que deviam acontecer através de empréstimos concedidos com a finalidade de estimular “os investimentos de capital com fins produtivos”. O Banco Mundial abriu suas portas logo após o encerramento da Segunda Guerra mundial em um momento de profunda crise financeira e insegurança bélica (BLACK, 1962, p. 81, 82). Entre maio e agosto o Banco investiu 497 milhões de dólares para a reconstrução da França, Holanda, Dinamarca e Luxemburgo, sendo a regularidade desses empréstimos, que aconteciam com a antecipação de um ano a sete meses em respeito ao Plano Marschal 4, “decisiva” para regular o fluxo de importações e não causar atraso na recuperação da Europa (BLACK, 1962, p. 83). Apesar de continuar realizando empréstimos para a Europa o Banco Mundial inicia negociações com países subdesenvolvidos, efetivando as primeiras 4 O Plano Marchall divulgado em 1947 por George Marchall secretário dos Estados Unidos, tinha por objetivo, a partir do rompimento com o impasse econômico, auxiliar os países arruinados pela Segunda Guerra Mundial em seu processo de reconstrução econômica (ROLLO, 1994, p. 842). 4 negociações com a América Latina, especificamente com o Chile em 1948. Inicialmente o Banco não dispunha de fundos, problema este resolvido pelos Estados Unidos, em 1947, quando “[...] liberaram para empréstimos todos os pagamentos à conta da sua subscrição do capital do Banco” (BLACK, 1962, p. 91). Em 1952 o B.M. já tinha condições realizar empréstimos em grandes quantidades sendo, em 1959, liberadas para empréstimo “[...] todas as divisas da Europa ocidental em poder do Banco. Ao terminar 1959, o Banco podia operar em trinta e duas divisas diferentes” (BLACK, 1962, p. 91). A partir destas informações percebe-se que o Banco Mundial, de forma aligeirada, estendeu seus tentáculos as mais remotas regiões do mundo, fato conseqüente de sua “objetividade e perícia em finanças” (BLACK, 1962, p. 93). As técnicas desenvolvidas pela instituição, o significativo desempenho e abrangência nas relações econômicas internacionais, atribuem ao Banco Mundial o caráter de mediador e articulador internacional, tornando-se importante ferramenta para a consolidação do bloco capitalista, liderado pelos Estados Unidos, contra o bloco socialista, liderado pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) (BLACK, 1962, p. 93). A partir de 1950 inicia-se uma “redistribuição de influências pelo mundo” que objetivava proteger e agregar interesses, com vistas a estabelecer medidas que propiciassem o desenvolvimento do comércio nos países membros (MAZO et al., 2004 p. 4). As relações internacionais passaram a orientar como deveriam acontecer as relações de mercado, posteriormente denominado de portas abertas. Este modelo legou à periferia a única função de abrir seu mercado à Europa e, a partir disso, desenvolver atividades primárias. A prevalência do livre comércio, que aconteceu primeiramente na periferia e depois no centro, definiu a “divisão internacional de trabalho”, onde a América Latina, devido ao “dinamismo econômico”, apresentou à Europa países como Brasil, México e argentina (CERVO, 2003). O desenvolvimento e a organização da atividade humana tornaram-se as bases para a construção das nações modernas. Mesmo os países menos desenvolvidos que passaram por condições de extrema miséria, enfermidade e dominação pelas nações economicamente superiores, assumiram a “mentalidade do desenvolvimento”, a qual para os países mais avançados tornou-se um impulso para além terra, levando o homem a crer que através do progresso científico seria possível “[...] avançar aos saltos ao invés de progredir a passo” (HARBISON e MYERS, 1965, p. 13). 5 A PROPAGANDA DO DESENVOLVIMENTO COMO PRESCRIÇÃO PARA A EDUCAÇÃO A propaganda revolucionária em torno do desenvolvimento foi apresentada em diversos países que, posteriormente, desenvolveram conceitos relativos à realidade econômica de cada um, sendo significativo para alguns a industrialização, para outros a independência política e econômica, a educação, e ainda para outros mega construções (HARBISON e MYERS, 1965, p. 13). A “aspiração” pelo desenvolvimento econômico, “modernização política e social” conduziu os países a uma acirrada corrida pelos primeiros lugares nas classificações por riqueza e desenvolvimento. A década de 50 marcou o início de uma fase de grande desenvolvimento econômico, sendo denominada “a Era do Ouro”. Neste período alguns pesquisadores tendiam a acreditar que a economia iria dar um salto contínuo para frente, onde não haveria brecha para dúvidas de que algo pudesse alterar a realidade econômica, vivenciada principalmente pelos países capitalistas desenvolvidos. A industrialização ganhou fôlego neste período e se expandiu para regiões capitalistas e socialistas como Bulgária e Romênia (HOBSBAWM, 1995, p. 255). A década de 60 evidencia a explosão da economia mundial, pois, a produção de manufaturas praticamente quadruplicou entre o início da década de 1950 e início da década de 1970, aumentando, posteriormente, o “comércio mundial de produtos manufaturados” em dez vezes (HOBSBAWM, 1995, p. 255). A expansão econômica era movida principalmente pela revolução tecnológica que passou a fazer parte do mundo rico e de alguma forma também do mundo pobre. Esta “[...] revolução tecnológica entrou na consciência do consumidor em tal medida que a novidade se tornou o principal recurso de venda para tudo” (HOBSBAWM, 1995, p. 259, 261). Para atender a esta complexa tecnologia tornava-se necessário pesquisar para desenvolver. O processo contínuo de inovação apresentou gastos indispensáveis para que novos produtos fossem desenvolvidos. A partir das necessidades do mercado tornava-se cada vez mais necessário treinar homens e mulheres para que, com sua força de trabalho, movimentassem a máquina capitalista. Em grande parte do mundo procurou-se respostas a estas expectativas. A educação foi apresentada como uma das possíveis responsáveis pela formação deste novo modelo de homem. 6 O ACATAMENTO E A INSERÇÃO DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO NA LEI 5692/71 O trabalho esta no cerne do capitalismo, caracterizado como “atividade básica”, sendo o trabalhador o “agente principal”. Esta importância se encontra sempre em alternância com o pouco reconhecimento social e político que nascem das injustas trocas econômicas que permeiam “trabalho e dinheiro” (SILVA, 2006, p.7). No Brasil, como em boa parte do mundo, o capitalismo necessitou de mão de obra capacitada para exercer as novas funções impostas pela industrialização. Esta capacitação foi direcionada às instituições escolares tornando-as responsáveis pela “[...] formação dos sujeitos de acordo com as novas configurações do trabalho a serviço da acumulação de capital e sustentado em orientações econômicas liberais e tecnicistas” (SILVA, 2006, p.5). Segundo Fonseca (2008, p. 6) as orientações que as escolas recebiam objetivavam adequá-las, através da proposta pedagógica tecnicista, à política e ao mercado econômico, que se encontrava em pleno desenvolvimento. A Lei 5692/71 veio, além de habilitar o aluno para o trabalho profissional, impedir o acesso aos cursos superiores, pois a, [...] educação para o trabalho e suas formas históricas de oferta, pelo Estado, no período de vigência da Lei de Diretrizes e Bases de Ensino do 1º e 2º graus, estabelecida em 1971 (Lei 5692/71), ao pretender dar uma habilitação profissional aos concluintes do Ensino Médio teve uma nova função social, a de conter o aumento da demanda de vagas aos cursos superiores. A lei pretendia que o Segundo Grau tivesse a terminalidade como característica básica, através do ensino profissionalizante, contrapondo-se à frustração da falta de uma habilitação profissional (SILVA, 2006, p.2). O conteúdo tecnicista apresentado pela 5692/71 também entrava em choque com a formação politécnica que, [...] por sua vez, embora guarde diferenças com as concepções gramscianas também compreende a superação da formação unilateral do trabalhador e é apontada como o meio adequado para se atingir os pressupostos da escola unitária em oposição à proposta burguesa de formação escolar por permitir aos trabalhadores uma educação que lhes possibilite considerar mais do que a organização imediata da divisão do trabalho e perceber criticamente a sua correspondente estratificação social (SILVA, 2006, p. 25). Deste modo, a escola era estruturada de forma a atender aos princípios do capital que, após ser disseminada nos “[...] processos de subjetivação, no plano cultural, social, político e também psicológico”, culminavam na “domesticação” do trabalhador. A política econômica orientada pelo capital internacional produz a idéia que a qualificação de capital humano, a partir das instituições escolares, era a garantia de ascensão social (SILVA, 2006, p. 38,39). 7 Para o êxito deste empreendimento os professores “eram peças fundamentais” para moldar, configurar e ajustar os estudantes ao desenvolvimento econômico, para isso seria necessário valorizar os princípios de aprendizado, as teorias, a solução de problemas que utilizassem métodos analíticos e em contraponto relegar a instrução ou formação específica a um plano de menor valor (SCHULTZ, 1971, p. 147 grifo nosso), sendo basicamente necessário encontrar, novas tecnologias que fossem utilizadas por professores com baixa remuneração e qualificação. A formação de capital humano, a partir da educação, tornou-se, para o capital, fundamental para o planejamento econômico, pois, [...] o esclarecimento do conceito de capital humano e a sua identificação mobilizaram as coisas para uma especificação mais completa de mensuração e acumulação de capital moderno. Fez, também, com que nos tornássemos mais conscientes das mudanças que se registraram na qualidade do capital material. Desta forma, o fato de tratar a educação como capital humano nada mais é senão um passo à frente rumo a uma captação consciente de todo o capital (SCHULTZ, 1971, p. 130). O desenvolvimento de recursos humanos tornou-se fundamental para a organização das sociedades no âmbito econômico, político e social. Vários profissionais como juízes, advogados, médicos, engenheiros, artesãos, artistas e também professores precisavam ser “treinados” com vistas ao desenvolvimento econômico. A economia caracterizada como avançada, na década de 60, necessitava que as “capacidades” humanas fossem desenvolvidas até seus limites, pois, “o progresso humano é basicamente o resultado do esforço humano” onde os principais artífices da economia são as elites que orientam a “marcha para o progresso” (HARBISON e MYERS, 1965, p. 27, 31). Dentro deste contexto são criadas outras possibilidades com o objetivo de suprirem com mais velocidade os interesses capitalistas também nos países latino-americanos através de, [...] programas de treinamento vocacional na indústria, financiados pelo empregador nas fábricas do país. Na Colômbia, por exemplo, o SENA (Servicio Nacional de Aprendizaje) tem desenvolvido notável programa de treinamento de aprendizes [...]. O programa em pauta é financiado por uma incidência tributária sobre as fôlhas de pagamento dos estabelecimentos industriais, que empregam vinte ou mais operários, tendo um capital equivalente a 100.000 dólares americanos ou mais (HARBISON e MYERS, 1965, p. 109). Este financiamento permitiu ao SENA equipar e construir “centros vocacionais” e também foi responsável pelo emprego de instrutores especializados. O SENA era comandado não pelo Ministério da Educação, mas “pelas organizações empregadoras”. Deste modo a educação que promoviam respondia em menor tempo aos interesses do mercado e com mais 8 qualidade do que a educação formal, pois seu “financiamento e operação” aconteciam pelos empregadores (HARBISON e MYERS, 1965, p. 110). A avaliação da força da educação em relação ao crescimento econômico foi realizada a partir de “ajustamentos estatísticos de funções de produção” para que fosse encontrado o nível real do produto “[...] a partir do estoque de capital material, da força de trabalho bruta, do capital humano e do nível de conhecimento tecnológico” (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 151). Langoni 5 (1074, apud SIMONSEN E CAMPOS 1976, p. 152, 153) identificou a rentabilidade de vários níveis de educação no período entre 1960 e 1969. O ensino primário completo, em relação aos rendimentos, apresentou os melhores índices e situou a passagem do colegial para o diploma universitário como menos “rentável”, isto devido ao um padrão mais elevado do ensino primário e em contrapartida aos elevados custos nas universidades. Neste período foi percebida uma significativa inversão da rentabilidade quando houve uma queda no ensino primário seguida de elevação no ensino superior, devido à necessidade do mercado de mão de obra qualificada. As elevadas taxas relativas à rentabilidade, apresentadas na pesquisas, sugeriram uma “[...] forte correlação entre nível de renda e escolaridade” (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 153). Na mesma pesquisa foram analisadas e identificadas, [...] as fontes do crescimento do produto real entre 1960 e 1970 [...]. A acumulação de capital físico foi responsável por 32,01% de crescimento verificado. A educação por 30,44% do crescimento em causa, sendo 14,70% atribuíveis à educação de manutenção (isto é, aos gastos realizados para manter o mesmo nível de qualificação da mão-de-obra, tendo em vista o crescimento da força de trabalho) e 15,74% ao acréscimo do nível educacional da população economicamente ativa. (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 153). O equilíbrio entre a acumulação física de capital e da educação para o crescimento econômico é muito significativa, pois na década de 60 a formação de capital era responsável por 17% e os “dispêndios” do produto interno bruto para com a educação eram de apenas 3%. Deste modo, percebeu-se que a renda individual aliada ao nível de escolaridade poderia propiciar uma melhor “distribuição de renda” e conseqüentemente elevar o crescimento econômico (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 155). Segundo Simonsen e Campos (1976, p. 155, 156, 157) em 1964 o governo realizou um enorme trabalho visando o “enriquecimento 5 LANGONI, C. As causas do crescimento econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Apec, 1974. 9 do nosso capital humano”, mas a educação continuava em um segundo plano, pois o pouco que se gastava era “absurdamente” mal investido em educação, pois os currículos eram irreais e investiam em uma “cultura de salões” em que a educação era apresentada mais como lazer. O ensino evoluía horizontalmente e proporcionava uma educação inútil onde o latim era mais valorizado do que a matemática, as humanidades eram sobrepostas a “formação técnica e científica”. A partir de 1694 surge um grande esforço para a melhoria de qualidade e pela quantidade de acesso à educação no Brasil. Neste momento, a educação deixa de ser relegada ao segundo plano resultando na, [...] alocação de maiores recursos financeiros à educação: os dispêndios federais em educação passando a absorver uma parcela substancialmente maior do Orçamento da União, e os Estados e Municípios foram obrigados, por vários dispositivos constitucionais, a ampliar a assistência financeira a educação (à qual estão vinculados 20% da receita tributária dos municípios, e também 20% do Fundo de Participação dos Estados e Municípios). Como conseqüência, os dispêndios totais com a educação aumentaram de 2,2% do Produto Interno Bruto, em 1964, para 3,8% a partir de 1969. Tendo em vista que entre 1964 e 1972 o Produto Real aumentou de 81,5%, conclui-se que as despesas em educação aumentaram, em termos reais, de 214% (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 159). Com o aumento dos recursos houve também um aumento significativo das matrículas, pois entre 1960 e 1970 o número de habitantes (5 a 24 anos) subiu de 32,0 milhões para 43,6 milhões aumentando conseqüentemente a necessidade de escolas, professores para suprir as necessidades educacionais que aumentaram nos três níveis de ensino de 8,7 para 18,1. É importante ressaltar que este investimento em educação é devido aos péssimos resultados da pirâmide educacional anterior a 64 (SIMONSEN e CAMPOS, 1976, p. 163), resultados estes relacionados à mão de obra não qualificada inserida em um mercado ávido por alunos/trabalhadores que correspondam aos interesses capitalistas. A partir destas estatísticas foram valorizados os treinamentos profissionais realizados pelo PIPMO (Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra), SENAC e SENAI que caíram com uma luva aos interesses do mercado, pelos resultados significativos que apresentaram em relação ao “campo de treinamento” de profissionais. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esse artigo foi pautado pela necessidade de se aprofundar o conhecimento de influências internacionais na educação brasileira. A educação, historicamente, foi vinculada aos propósitos da economia. Segundo os estudos aqui apresentados, no Brasil da segunda 10 metade do século XX as políticas educacionais foram concebidas para o modelo capitalista de educação, tendo na teoria do capital humano o seu conceito básico. Uma importante constatação é a da presença de modelos postos para a educação nacional: não foram empregados referenciais humanísticos vinculados diretamente ao desenvolvimento e ao refinamento pessoal e político dos sujeitos educandos, mas sim, referenciais econômicos encontrados em um ranking de países organizado conforme o seu nível de desenvolvimento material. Nessa política educacional foram apresentados os países subdesenvolvidos como modelos a serem evitados, enquanto os países desenvolvidos se arvoraram a condição de modelares. A educação daí resultada foi economicista e, conforme estudado, reduzida ao domínio de habilidades produtivas. Outra constatação que merece destaque é a da atuação de propagandistas estadunidenses da área econômica que figuraram como orientadores político-pedagógicos de grande influência na América Latina e com grande aceitação pelo governo brasileiro, ao ponto de seus discursos passarem a ser o mote educacional brasileiro. Essa situação flagra um momento em que definitivamente se optou por burocratas do capital a educadores especialistas à frente das políticas educacionais do Brasil. Encerra-se essa reflexão com o esclarecimento de que não se nega a necessária vinculação entre educação e trabalho, mas sim, com a crítica a um modelo educacional historicamente situado que, com o emprego de escolas e de professores segundo um projeto econômico, divorciou o trabalhador da evolução pessoal e política que a prática do trabalho tem condições de proporcionar. REFERÊNCIAS BLACK, E. A política do desenvolvimento econômico. Rio de Janeiro. Fundo de Cultura: 1962. CERVO, A. L. Política exterior e relações internacionais do Brasil: enfoque paradigmático. Revista brasileira de políticas internacionais, Brasília, v. 46, n. 2, Dec. 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S003473292003000200001&lng=en&nrm=iso> Acesso em 08 Jan. 2009. FONSECA, L. S. 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