cartas para a posteridade - Escola Superior Dom Helder Câmara

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CARTAS PARA A POSTERIDADE
RaRodolfo Jorge Walsh
Apresentação:
Virgílio de Mattos
Editor de Veredas do Direito
“Sin esperanza de ser escuchado, con la certeza de ser perseguido, pero
fiel al compromiso de dar testimonio en momentos difíciles”.1
Em três momentos distintos, faz trinta anos, o escritor, o jornalista,
o teórico, o analista de inteligência, o guerrilheiro, o líder montonero, o estrategista, o pai, mas antes e sobretudo o latino Rodolfo Jorge Walsh, cédula de
identidade n. 2.845.022, da República Argentina, escreveu três cartas fundamentais para compreendermos “Nuestra América”. Foi morto por causa
delas. Como se deixasse as cartas para a posteridade.
Walsh sabia que escrevia para a posteridade.
Segundo relatos seguros, inclusive de seus algozes – um grupo de
busca e captura da temível Escola de Mecânica da Armada (ESMA), centro de torturas que hoje virou museu e tem um espaço em memória de
Walsh –, ele foi cercado perto da esquina das Avenidas San Juan e Entre
Ríos, em Buenos Aires, no fatídico 25 de março de 1977, um dia após ter
escrito a célebre CARTA À JUNTA MILITAR, no momento em que acabava de colocar várias delas na caixa de correios da Praça da Constituição.
Foi perseguido e morto pelo Grupo de Tareas 332, da ESMA,
composto por dez homens escolhidos a dedo e fortemente armados, comandado pelo capitão de fragata Jorge Eduardo “El Tigre” Acosta2, pela ousadia de ter escrito e distribuído, na véspera, primeiro aniversário do golpe
militar, em todas as redações, sem que ninguém tivesse coragem de publi1
2
Rodolfo Jorge Walsh. Carta a Junta Militar.
Notório torturador argentino.
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car, a CARTA A JUNTA MILITAR, uma análise consistente, segura e correta até hoje. Nela denunciava a existência de 15 mil desaparecidos, 10 mil
presos políticos e 4 mil mortos, só no primeiro ano.
Dizia da existência de 7 mil habeas corpus impetrados em busca
dos detenidos-desaparecidos e 1.200 execuções sumárias de militantes,
disfarçadas de choques entre “subversivos e forças militares”. Na carta,
como que premunia seu fim ao relatar que a ditadura “matava guerrilheiros feridos e detidos em combates”.
Com rigor de bom jogador de xadrez, relatava que nesse primeiro
ano, o aparato repressivo da Junta, contabilizando seus “enfrentamientos”
com os subversivos, nos quais estes tiveram 600 mortos e só 15 feridos, e as
tropas da ditadura não sofreram nenhuma baixa, o que só poderia significar
execuções sumárias.
Fustiga não só o sistema econômico implantado pela Junta, que
congelou os salários, enquanto a inflação galopava 400% ao ano, e produziu
um milhão de desempregados; como a política internacional de terror reinante no Cone Sul, que dividiu a Argentina em antes e depois do golpe.
“Tantas veces me mataron,
tantas veces me morí,
sin embargo estoy aquí
resucitando.
Gracias doy a la desgracia
y a la mano con puñal,
porque me mató tan mal,
y seguí cantando”3.
Walsh resistiu a bala à abordagem, assim como havia feito antes
sua filha, e, partido ao meio por uma rajada de metralhadora, teve seu corpo
levado e exibido aos prisioneiros da ESMA. Espécie de macabro troféu.
Um detenido-desaparecido cujo cadáver, mais do que qualquer outro, se
recusa a desaparecer. Como se seu corpo morto devolvesse os golpes e o
vilipêndio sofridos, com a elegância de quem esgrime o fino fio da ironia.
Como se quanto mais permanecesse desaparecido, mais o encontrássemos.
Como se quanto mais passasse o tempo, próprio para o esquecimento, mais
o lembrássemos.
3
Como la cigarra. María Elena Walsh.
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Rodolfo Jorge Walsh
“DE APARECER APARECIÓ,
PERO EN UMA LISTA DE DESAPARECIDOS”
4
Sabia que saberíamos. Sabia que entenderíamos e porque entenderíamos não deixaríamos, quando fosse possível, que sua memória deixasse de ser referência e reverência em tempos tristese sombrios, se é que
podemos dizer que vivemos em tempos sombrios se compararmos o tempo
em que vivemos hoje com o tempo em que mataram Walsh.
Àquela época, final dos anos 1970, todo o Cone Sul vivia mergulhado em ditaduras brutais. A Argentina, o Brasil e o Chile disputavam em
crueldade o título pouco invejável de Campeão Mundial de horrores. Nessa
disputa podemos dizer que ganhamos a medalha de bronze. Uruguai e
Paraguai, a mais antiga dentre todas elas, pareciam comportadas escolares
fazendo maldades no horário do recreio, perto da bestialidade chilena e argentina, principalmente.
A ditadura militar argentina, feroz e covarde, matou duas gerações dos Walsh. Pai e filha sucumbiram, em momentos distintos, ambos de
armas na mão, ambos sem saída, constroem com a própria morte um exemplo de vida sem se renderem e, sobretudo, sem se venderem.
E que exemplo!
Rodolfo não se escondeu, como tantos, por detrás de confortáveis
empregos em assessorias de imprensa de multinacionais, ou de grandes
empresas nacionais, com a espinha dobrada, a cabeça baixa, dizendo “sim,
senhor”. Como poucos, expôs-se e se impôs como um jornalista que combateu com palavras e ações, até mesmo a última delas quando, depois de
não ter se vendido, recusou-se peremptoriamente a compor a ala dos rendidos.
Generoso, já havia entrado para a história antes, quando, em 1959,
juntamente com Gabriel García Márquez, funda a agência de notícias Prensa Latina, em Cuba. Mas parece que precisava dizer mais, ressaltar mais,
como quem grifa, como quem destaca, como quem marca o mais importante, para que compreendamos bem, como se dissesse: “– Estou dando a
minha vida, o que mais querem vocês? O que mais falta fazer?”
Nunca, ao que se sabe, posou de intelectual imparcial, objetivo.
Como se imparcialidade e “objetividade” fossem possíveis naquele tempo.
Como se ser imparcial fosse possível em qualquer tempo.
4
Nicanor Parra. De Poesia Política. Santiago: Bruguera, 1983.
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Se deixou a vida para entrar na história, antes mesmo de deixá-la
já havia conseguido seu lugar de destaque.
Em 1976, em inteligentíssima resposta à censura imposta pela ditadura militar da Junta, cria a Agência de Notícias Clandestina, ANCLA.
Sistema de informações mano a mano, cujos impressos traziam um
atualíssimo cabeçalho, em tempos de “mídia gorda” – para emprestarmos a
feliz expressão de Mylton Severiano, que só reproduz as notícias de interesse dos poderosos, dos que exploram, dos que amedrontam:
Reproduza esta informação. Faça-a circular por todos os meios a
seu alcance: a mão, por mimeógrafo, oralmente. Mande cópias a seus amigos: nove de cada dez estão esperando. Milhões querem ser informados. O
terror se baseia na incomunicabilidade. Rompa esse isolamento. Volte a
sentir a satisfação moral de um ato de liberdade. Derrote o terror. Faça
circular esta informação.
Jamais picado pela mosca azul. Jamais exercitando a “síndrome
de vedete”, tão comum no sul do sul, nosso verdadeiro sul profundo. Herói
em grupo. Não foi um herói individual, embora possamos lembrar seu nome
para nossos filhos e netos. Um herói da humanidade.
Antes mesmo de Truman Capote, que em 1966 entrou para a
história da literatura com A Sangue Frio, Walsh, com seu Operação Massacre, tratando de um tema de quase dez anos antes, já inaugurava o gênero
que mistura ficção e realidade.
La primera noticia sobre los fusilamientos clandestinos de junio de
1956 me llegó en forma casual, a fines de ese año, en un café de La Plata
donde se jugaba al ajedrez, se hablaba más de Keres5 o Nimzovitch6 que de
Aramburu7 y Rojas8, y la única maniobra militar que gozaba de algún renombre
era el ataque a la bayoneta de Schlechter9 en la apertura siciliana.
Ler seus textos, qualquer que seja o gênero, faz com que tenhamos inveja. Aquela positiva inveja do “como não fui eu que fiz?”
Paul Keres foi um dos melhores jogadores de xadrez de todos os tempos, mesmo sem ter sido
Campeão do Mundo.
6
Aaron Nimzovitsch, considerado o pai da Escola Hipermoderna do xadrez, que revolucionou
a abordagem teórica do jogo no último século.
7
O general Pedro Eugenio Aramburu Cilveti foi o presidente da Argentina entre 1955 e 1958.
8
O almirante Isaac Francisco Rojas Madariaga foi vice-presiednete de Aramburu no período
1955-1958.
9
Carl Schlechter foi um famoso mestre enxadrista austríco do início do século XX. Empatou
com o fabuloso Emanuel Lasker no Campeonato Mundial de Xadrez de 1910. Morreu de fome
e frio em Budapeste, no inverno de 1918.
5
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Rodolfo Jorge Walsh
A guerra que custou sua vida e a de sua filha, e de milhares de
outros patriotas argentinos que resistiam, de armas na mão ou não, à ditadura militar, não lhe foi indiferente, assim como nossa memória, esse “monstro grande e que pisa forte toda a pobre inocência de nossa gente”10,
não pode esquecer e deixar de contar seu exemplo.
Um homem de sorte e de fibra. Como poucos.
A DOR DA GENTE NÃO SAI NO JORNAL
A primavera de 1976 foi um desastre. Uma catástrofe para a
família Walsh. Um desastre especial para a 2ª Oficial Hilda. Aliás Vicki.
Aliás María Victoria Walsh, sua filha mais velha.
Rodolfo escreve a forte e delicada CARTA AOS AMIGOS, para
“explicar-lhes como morreu Vicki e por quê morreu”, três meses depois.
Consegue fazê-lo noventa dias depois da morte da primogênita, naquelas
condições inóspitas de sobrevivência, para dizermos elegantemente.
Avisa desde logo, aparentemente frio:
O comunicado do Exército que publicaram os jornais não é muito
diferente, nessa oportunidade, dos fatos. Efetivamente, Vicki era a 2ª Oficial da Organização Montoneros, responsável pela imprensa sindical e seu
nome de guerra era Hilda. Efetivamente estava reunida, nesse dia, com
quatro membros da Secretaria Política [SP] que combateram e morreram
com ela.
Vamos voltar um pouco a linha do tempo.
Vicki foi militar em uma favela. Era seu primeiro contato, diz a
CARTA, com a probreza extrema, em cujo nome combatia, tendo saído
dessa experiência com um ascetismo que impressionava.
Várias são as qualidades dessa mulher madura, em seus vinte e
seis anos, cujo marido, Emiliano Costa, foi preso no começo de 1975 e que
ela não tornou a ver nunca mais. A filha de ambos, testemunha muda do
heróico final da mãe, que nasceria pouco depois da prisão do pai, acompanhava Vicki no seu duro último ano de vida.
Walsh conta na CARTA AOS AMIGOS:
Nos víamos uma vez por semana, a cada quinze dias. Eram contatos curtos, caminhando pela rua, talvez dez minutos em um banco de praça. Fazíamos planos para vivermos juntos, para ter uma casa onde conver-
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sar, recordar, estar juntos em silêncio. Pressentíamos, entretanto, que isso
não aconteceria, que um desses fugazes encontros seria o último, e nos
despedíamos simulando valor, consolando-nos a antecipada perda.
A decisão de não se entregar havia sido madurada diante da infinidade de testemunhos sobre as torturas (retirada da pele em vida, mutilação de membros, a tortura pela tortura, sem limite nem de tempo e nem de
método) praticadas contra aqueles que tinham a desgraça de caírem com
vida nas garras dos militares.
Prossegue Walsh:
“No dia 28 de setembro, quando entrou na casa da Rua Corro,
fazia 26 anos. Levava a filha nos braços porque no último momento não
encontrou com quem deixá-la. (...) Às sete da manhã do dia 29 foi despertada pelos alto-falantes do Exército e pelos primeiros tiros.”
Vicki, diz um soldado que participou do cerco, atirava rajadas curtas com sua metralhadora Halcón e ria quando os militares (mais de 150
homens) se escondiam.
Aos caminhões de transporte de tropas somava-se um tanque e
um helicóptero que foi contido e afastado pelos disparos de Vicki.
Ainda segundo o relato do soldado que participou do cerco:
Houve um silêncio e, súbito, a moça deixou a metralhadora, ficou
de pé sobre o parapeito e abriu os braços. Deixamos de atirar sem que
ninguém tivesse ordenado e pudemos vê-la bem. Era magrinha tinha o cabelo curto e estava de camisola. Começou a falar conosco em voz alta, mas
muito tranqüila, não me recordo de tudo que ela disse. ‘Vocês não nos matam’, disse, ‘somos nós que elegemos morrer’. Encostou uma pistola na
têmpora e se matou diante de todos nós.
No térreo, onde havia cinco cadáveres, a filha que sobreviveu,
com pouco mais de um ano, estava sentada na cama.
A CARTA À DIREÇÃO NACIONAL DE MONTONEROS
“No se puede vencer a un enemigo sin antes comprenderlo”11
Genial com as palavras, reflexo talvez da inteligência fina de enxadrista, Walsh assina o documento da arguta – o tempo comprovou o acerto dos estudos e propostas por ele feitas – análise de conjuntura para o
período de 23 de novembro de 1976 a 2 de janeiro de 1977 – como Rodolfo
Walsh, Oficial de Inteligência, Montoneros.
11
Rodolfo Jorge Walsh.
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Rodolfo Jorge Walsh
Naquela peça, hoje histórica, relata que no último trimestre de
1976 as forças da resistência, que ele denomina “campo popular”, tiveram
um número de mortos que oscilou entre 200 e 300 por mês.12
Analisa que, após a destruição do ERP13, em julho de 1976, as
forças da ditadura passaram a se concentrar na destruição dos Montoneros14.
Em fins de setembro, já haviam destruído a Secretaria Política Nacional da
organização, dizimado as direções zonais e La Plata e Norte, e assestado
fortes golpes contra as direções zonais do Sul, Oeste, Capital, bem como
nas estruturas de imprensa e informações.
“Tantas veces me borraron,
tantas desaparecí,
a mi propio entierro fui,
solo y llorando.
Hice un nudo del pañuelo,
pero me olvidé después
que no era la única vez
y seguí cantando”15.
Walsh alertava que, dando início à Fase 4, que a própria ditadura
denominou de “Extermínio”, 1977 seria um ano dificílimo: “A propaganda
militar inimiga dispõe de todos os meios de difusão, que utiliza para pregar o
isolamento da guerrilha e seu próximo aniquilamento, e para ocultar o
fuzilamento de reféns, disfarçado com enfrentamento”.
Apesar de avisado por companheiros de luta que o ponto ao qual
compareceria poderia estar “envenenado”, isto é, já ser do conhecimento
das forças da ditadura, preferiu arriscar. Preferiu pagar o preço, alto demais, de sua própria existência.
Um número expressivamente brutal se se considera que a Resistência no Brasil, no período de
1964 a 1988, quando efetivamente termina a ditadura militar, houve pouco menos de 500
mortos.
13
O ERP, Ejercito Revolucionário del Pueblo, nasce como conseqüência de uma decisão política
do último congresso do Partido Revolucionário de Los Trabajadores (PRT), em 1968, com a
proposta de organizar um “partido para o combate”. Não era, como erroneamente se poderia
supor, um braço armado do PRT, mas pretendia ser uma organização de massas com um programa
antiimperialista, anticapitalista e democrático.
14
Montoneros foi um grupo de guerrilha urbana argentina que agiu entre 1970 e 1977, se
apresentou à sociedade em 1º de junho de 1970, mediante o seqüestro e posterior justiçamento do
general Pedro Eugenio Aramburu.
15
María Elena Walsh.Como la cigarra.
12
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Nunca a tentativa vã de calar pela força, fazendo desaparecer da
vida um homem de luta, verdadeiramente de luta, produziu um efeito tão ao
contrário do esperado.
Já nos lembramos de seu exemplo e quando o tempo da maldade
acabar definitivamente na Terra, poderemos ter a paz que ele buscou lutando, por toda sua vida.
“Tantas veces te mataron,
tantas resucitarás
cuántas noches pasarás
desesperando.
Y a la hora del naufragio
y a la de la oscuridad
alguien te rescatará,
para ir cantando16".
Confiram a íntegra dos três documentos, memória da história de
luta de um povo vizinho.
Boa leitura!
16
María Elena Walsh. Como la cigarra.
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Rodolfo Jorge Walsh
CARTA ABIERTA DE
RODOLFO WALSH A LA JUNTA MILITAR
Buenos Aires, 24 de marzo de 1977
“1. La censura de prensa, la persecución a intelectuales, el
allanamiento de mi casa en el Tigre, el asesinato de amigos queridos y la
pérdida de una hija que murió combatiéndolos, son algunos de los hechos
que me obligan a esta forma de expresión clandestina después de haber
opinado libremente como escritor y periodista durante casi treinta años.
El primer aniversario de esta Junta Militar ha motivado un balance
de la acción de gobierno en documentos y discursos oficiales, donde lo que
ustedes llaman aciertos son errores, los que reconocen como errores son
crímenes y lo que omiten son calamidades.
El 24 de marzo de 1976 derrocaron ustedes a un gobierno del que
formaban parte, a cuyo desprestigio contribuyeron como ejecutores de su
política represiva, y cuyo término estaba señalado por elecciones convocadas
para nueve meses más tarde. En esa perspectiva lo que ustedes liquidaron
no fue el mandato transitorio de Isabel Martínez sino la posibilidad de un
proceso democrático donde el pueblo remediara males que ustedes
continuaron y agravaron.
Ilegítimo en su origen, el gobierno que ustedes ejercen pudo
legitimarse en los hechos recuperando el programa en que coincidieron en
las elecciones de 1973 el ochenta por ciento de los argentinos y que sigue en
pie como expresión objetiva de la voluntad del pueblo, único significado posible
de ese “ser nacional” que ustedes invocan tan a menudo.
Invirtiendo ese camino han restaurado ustedes la corriente de ideas
e intereses de minorías derrotadas que traban el desarrollo de las fuerzas
productivtas, explotan al pueblo y disgregan la Nación. Una política semejante
sólo puede imponerse transitoriamente prohibiendo los partidos, interviniendo
los sindicatos, amordazando la prensa e implantando el terror más profundo
que ha conocido la sociedad argentina.
2. Quince mil desaparecidos, diez mil presos, cuatro mil muertos,
decenas de miles de desterrados son la cifra desnuda de ese terror.
Colmadas las cárceles ordinarias, crearon ustedes en las principales
guarniciones del país virtuales campos de concentración donde no entra
ningún juez, abogado, periodista, observador internacional. El secreto militar
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de los procedimientos, invocado como necesidad de la investigación,
convierte a la mayoría de las detenciones en secuestros que permiten la
tortura sin límite y el fusilamiento sin juicio (1).
Más de siete mil recursos de hábeas corpus han sido contestados
negativamente este último año. En otros miles de casos de desaparición el
recurso ni siquiera se ha presentado porque se conoce de antemano su
inutilidad o porque no se encuentra abogado que ose presentarlo después
que los cincuenta o sesenta que lo hacían fueron a su turno secuestrados.
De este modo han despojado ustedes a la tortura de su límite en el
tiempo. Como el detenido no existe, no hay posibilidad de presentarlo al juez
en diez días según manda un ley que fue respetada aún en las cumbres
represivas de anteriores dictaduras.
La falta de límite en el tiempo ha sido complementada con la falta
de límite en los métodos, retrocediendo a épocas en que se operó directamente
sobre las articulaciones y las vísceras de las víctimas, ahora con auxiliares
quirúrgicos y farmacológicos de que no dispusieron los antiguos verdugos.
El potro, el torno, el despellejamiento en vida, la sierra de los inquisidores
medievales reaparecen en los testimonios junto con la picana y el “submarino”, el soplete de las actualizaciones contemporáneas (2).
Mediante sucesivas concesiones al supuesto de que el fin de exterminar a la guerilla justifica todos los medios que usan, han llegado ustedes
a la tortura absoluta, intemporal, metafísica en la medida que el fin original
de obtener información se extravía en las mentes perturbadas que la
administran para ceder al impulso de machacar la sustancia humana hasta
quebrarla y hacerle perder la dignidad que perdió el verdugo, que ustedes
mismos han perdido.
3. La negativa de esa Junta a publicar los nombres de los
prisioneros es asimismo la cobertura de una sistemática ejecución de rehenes
en lugares descampados y horas de la madrugada con el pretexto de
fraguados combates e imaginarias tentativas de fuga.
Extremistas que panfletean el campo, pintan acequias o se
amontonan de a diez en vehículos que se incendian son los estereotipos de
un libreto que no está hecho para ser creído sino para burlar la reacción
internacional ante ejecuciones en regla mientras en lo interno se subraya el
carácter de represalias desatadas en los mismos lugares y en fecha inmediata
a las acciones guerrilleras.
Setenta fusilados tras la bomba en Seguridad Federal, 55 en
respuesta a la voladura del Departamento de Policía de La Plata, 30 por el
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atentado en el Ministerio de Defensa, 40 en la Masacre del Año Nuevo que
siguió a la muerte del coronel Castellanos, 19 tras la explosión que destruyó
la comisaría de Ciudadela forman parte de 1.200 ejecuciones en 300
supuestos combates donde el oponente no tuvo heridos y las fuerzas a su
mando no tuvieron muertos.
Depositarios de una culpa colectiva abolida en las normas civilizadas de justicia,incapaces de influir en la política que dicta los hechos por los
cuales son represaliados, muchos de esos rehenes son delegados sindicales,
intelectuales, familiares de guerrilleros, opositores no armados, simples
sospechosos a los que se mata para equilibrar la balanza de las bajas según
la doctrina extranjera de “cuenta-cadáveres” que usaron los SS en los países ocupados y los invasores en Vietnam.
El remate de guerrilleros heridos o capturados en combates reales
es asimismo una evidencia que surge de los comunicados militares que en
un año atribuyeron a la guerrilla 600 muertos y sólo 10 ó 15 heridos, proporción
desconocida en los más encarnizados conflictos. Esta impresión es confirmada por un muestreo periodístico de circulación clandestina que revela
que entre el 18 de diciembre de 1976 y el 3 de febrero de 1977, en 40
acciones reales, las fuerzas legales tuvieron 23 muertos y 40 heridos, y la
guerrilla 63 muertos (3).
Más de cien procesados han sido igualmente abatidos en tentativas de fuga cuyo relato oficial tampoco está destinado a que alguien lo crea
sino a prevenir a la guerrilla y Ios partidos de que aún los presos reconocidos
son la reserva estratégica de las represalias de que disponen los Comandantes de Cuerpo según la marcha de los combates, la conveniencia didáctica o
el humor del momento.
Así ha ganado sus laureles el general Benjamín Menéndez, jefe
del Tercer Cuerpo de Ejército, antes del 24 de marzo con el asesinato de
Marcos Osatinsky, detenido en Córdoba, después con la muerte de Hugo
Vaca Narvaja y otros cincuenta prisioneros en variadas aplicaciones de la
ley de fuga ejecutadas sin piedad y narradas sin pudor (4).
El asesinato de Dardo Cabo, detenido en abril de 1975, fusilado el
6 de enero de 1977 con otros siete prisioneros en jurisdicción del Primer
Cuerpo de Ejército que manda el general Suárez Masson, revela que estos
episodios no son desbordes de algunos centuriones alucinados sino la política misma que ustedes planifican en sus estados mayores, discuten en sus
reuniones de gabinete, imponen como comandantes en jefe de las 3 Armas
y aprueban como miembros de la Junta de Gobierno.
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4. Entre mil quinientas y tres mil personas han sido masacradas en
secreto después que ustedes prohibieron informar sobre hallazgos de cadáveres que en algunos casos han trascendido, sin embargo, por afectar a
otros países, por su magnitud genocida o por el espanto provocado entre sus
propias fuerzas (5).
Veinticinco cuerpos mutilados afloraron entre marzo y octubre de
1976 en las costas uruguayas, pequeña parte quizás del cargamento de torturados hasta la muerte en la Escuela de Mecánica de la Armada, fondeados
en el Río de la Plata por buques de esa fuerza, incluyendo el chico de 15
años, Floreal Avellaneda, atado de pies y manos, “con lastimaduras en la
región anal y fracturas visibles” según su autopsia.
Un verdadero cementerio lacustre descubrió en agosto de 1976
un vecino que buceaba en el Lago San Roque de Córdoba, acudió a la
comisaría donde no le recibieron la denuncia y escribió a los diarios que no
la publicaron (6).
Treinta y cuatro cadáveres en Buenos Aires entre el 3 y el 9 de
abril de 1976, ocho en San Telmo el 4 de julio, diez en el Río Luján el 9 de
octubre, sirven de marco a las masacres del 20 de agosto que apilaron 30
muertos a 15 kilómetros de Campo de Mayo y 17 en Lomas de Zamora.
En esos enunciados se agota la ficción de bandas de derecha,
presuntas herederas de las 3 A de López Rega, capaces de atravesar la
mayor guarnición del país en camiones militares, de alfombrar de muertos el
Río de la Plata o de arrojar prisioneros al mar desde los transportes de la
Primera Brigada Aérea (7), sin que se enteren el general Videla, el almirante Massera o el brigadier Agosti. Las 3 A son hoy las 3 Armas, y la Junta
que ustedes presiden no es el fiel de la balanza entre “violencias de distintos
signos” ni el árbitro justo entre “dos terrorismos”, sino la fuente misma del
terror que ha perdido el rumbo y sólo puede balbucear el discurso de la
muerte (8).
La misma continuidad histórica liga el asesinato del general Carlos
Prats, durante el anterior gobierno, con el secuestro y muerte del general
Juan José Torres, Zelmar Michelini, Héctor Gutiérrez Ruíz y decenas de
asilados en quienes se ha querido asesinar la posibilidad de procesos democráticos en Chile, Boliva y Uruguay (9).
La segura participación en esos crímenes del Departamento de
Asuntos Extranjeros de la Policía Federal, conducido por oficiales becados
de la CIA a través de la AID, como los comisarios Juan Gattei y Antonio
Gettor, sometidos ellos mismos a la autoridad de Mr. Gardener Hathaway,
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Rodolfo Jorge Walsh
Station Chief de la CIA en Argentina, es semillero de futuras revelaciones
como las que hoy sacuden a la comunidad internacional que no han de
agotarse siquiera cuando se esclarezcan el papel de esa agencia y de altos
jefes del Ejército, encabezados por el general Menéndez, en la creación de
la Logia Libertadores de América, que reemplazó a las 3 A hasta que su
papel global fue asumido por esa Junta en nombre de las 3 Armas.
Este cuadro de exterminio no excluye siquiera el arreglo personal
de cuentas como el asesinato del capitán Horacio Gándara, quien desde
hace una década investigaba los negociados de altos jefes de la Marina, o
del periodista de “Prensa Libre” Horacio Novillo apuñalado y calcinado,
después que ese diario denunció las conexiones del ministro Martínez de
Hoz con monopolios internacionales.
A la luz de estos episodios cobra su significado final la definición
de la guerra pronunciada por uno de sus jefes: “La lucha que libramos no
reconoce límites morales ni naturales, se realiza más allá del bien y del mal”
(10).
5. Estos hechos, que sacuden la conciencia del mundo civilizado,
no son sin embargo los que mayores sufrimientos han traído al pueblo argentino ni las peores violaciones de los derechos humanos en que ustedes
incurren. En la política económica de ese gobierno debe buscarse no sólo la
explicación de sus crímenes sino una atrocidad mayor que castiga a millones
de seres humanos con la miseria planificada.
En un año han reducido ustedes el salario real de los trabajadores
al 40%, disminuido su participación en el ingreso nacional al 30%, elevado
de 6 a 18 horas la jornada de labor que necesita un obrero para pagar la
canasta familiar (11), resucitando así formas de trabajo forzado que no
persisten ni en los últimos reductos coloniales. Congelando salarios a culatazos
mientras los precios suben en las puntas de las bayonetas, aboliendo toda
forma de reclamación colectiva, prohibiendo asambleas y comisiones internas, alargando horarios, elevando la desocupación al récord del 9% (12)
prometiendo aumentarla con 300.000 nuevos despidos, han retrotraído las
relaciones de producción a los comienzos de la era industrial, y cuando los
trabajadores han querido protestar los han calificados de subversivos,
secuestrando cuerpos enteros de delegados que en algunos casos aparecieron
muertos, y en otros no aparecieron (13).
Los resultados de esa política han sido fulminantes. En este primer
año de gobierno el consumo de alimentos ha disminuido el 40%, el de ropa
más del 50%, el de medicinas ha desaparecido prácticamente en las capas
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CARTAS PARA A POSTERIDADE
populares. Ya hay zonas del Gran Buenos Aires donde la mortalidad infantil
supera el 30%, cifra que nos iguala con Rhodesia, Dahomey o las Guayanas;
enfermedades como la diarrea estival, las parasitosis y hasta la rabia en que
las cifras trepan hacia marcas mundiales o las superan. Como si esas fueran
metas deseadas y buscadas, han reducido ustedes el presupuesto de la salud
pública a menos de un tercio de los gastos militares, suprimiendo hasta los
hospitales gratuitos mientras centenares de médicos, profesionales y técnicos se suman al éxodo provocado por el terror, los bajos sueldos o la
“racionalización”.
Basta andar unas horas por el Gran Buenos Aires para comprobar
la rapidez con que semejante política la convirtió en una villa miseria de diez
millones de habitantes. Ciudades a media luz, barrios enteros sin agua porque las industrias monopólicas saquean las napas subtérráneas, millares de
cuadras convertidas en un solo bache porque ustedes sólo pavimentan los
barrios militares y adornan la Plaza de Mayo , el río más grande del mundo
contaminado en todas sus playas porque los socios del ministro Martínez de
Hoz arrojan en él sus residuos industriales, y la única medida de gobierno
que ustedes han tomado es prohibir a la gente que se bañe.
Tampoco en las metas abstractas de la economía, a las que suelen
llamar “el país”, han sido ustedes más afortutunados. Un descenso del
producto bruto que orilla el 3%, una deuda exterior que alcanza a 600 dólares por habitante, una inflación anual del 400%, un aumento del circulante
que en solo una semana de diciembre llegó al 9%, una baja del 13% en la
inversión externa constituyen también marcas mundiales, raro fruto de la
fría deliberación y la cruda inepcia.
Mientras todas las funciones creadoras y protectoras del Estado
se atrofian hasta disolverse en la pura anemia, una sola crece y se vuelve
autónoma. Mil ochocientos millones de dólares que equivalen a la mitad de
las exportaciones argentinas presupuestados para Seguridad y Defensa en
1977, cuatro mil nuevas plazas de agentes en la Policía Federal, doce mil en
la provincia de Buenos Aires con sueldos que duplican el de un obrero industrial y triplican el de un director de escuela, mientras en secreto se elevan
los propios sueldos militares a partir de febrero en un 120%, prueban que no
hay congelación ni desocupación en el reino de la tortura y de la muerte,
único campo de la actividad argentina donde el producto crece y donde la
cotización por guerrillero abatido sube más rápido que el dólar.
6. Dictada por el Fondo Monetario Internacional según una receta
que se aplica indistintamente al Zaire o a Chile, a Uruguay o Indonesia, la
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Rodolfo Jorge Walsh
política económica de esa Junta sólo reconoce como beneficiarios a la vieja
oligarquía ganadera, la nueva oligarquía especuladora y un grupo selecto de
monopolios internacionales encabezados por la ITT, la Esso, las automotrices,
la U.S.Steel, la Siemens, al que están ligados personalmente el ministro
Martínez de Hoz y todos los miembros de su gabinete.
Un aumento del 722% en los precios de la producción animal en
1976 define la magnitud de la restauración oligárquica emprendida por
Martínez de Hoz en consonancia con el credo de la Sociedad Rural expuesto
por su presidente Celedonio Pereda: “Llena de asombro que ciertos grupos
pequeños pero activos sigan insistiendo en que los alimentos deben ser baratos” (14).
El espectáculo de una Bolsa de Comercio donde en una semana
ha sido posible para algunos ganar sin trabajar el cien y el doscientos por
ciento, donde hay empresas que de la noche a la mañana duplicaron su
capital sin producir más que antes, la rueda loca de la especulación en dólares, letras, valores ajustables, la usura simple que ya calcula el interés por
hora, son hechos bien curiosos bajo un gobierno que venía a acabar con el
“festín de los corruptos”.
Desnacionalizando bancos se ponen el ahorro y el crédito nacional en manos de la banca extranjera, indemnizando a la ITT y a la Siemens
se premia a empresas que estafaron al Estado, devolviendo las bocas de
expendio se aumentan las ganancias de la Shell y la Esso, rebajando los
aranceles aduaneros se crean empleos en Hong Kong o Singapur y
desocupación en la Argentina. Frente al conjunto de esos hechos cabe
preguntarse quiénes son los apátridas de los comunicados oficiales, dónde
están los mercenarios al servicio de intereses foráneos, cuál es la ideologia
que amenaza al ser nacional.
Si una propaganda abrumadora, reflejo deforme de hechos malvados no pretendiera que esa Junta procura la paz, que el general Videla
defiende los derechos humanos o que el almirante Massera ama la vida, aún
cabría pedir a los señores Comandantes en Jefe de las 3 Armas que meditaran
sobre el abismo al que conducen al país tras la ilusión de ganar una guerra
que, aún si mataran al último guerrillero, no haría más que empezar bajo
nuevas formas, porque las causas que hace más de veinte años mueven la
resistencia del pueblo argentino no estarán dcsaparecidas sino agravadas
por el recuerdo del estrago causado y la revelación de las atrocidades cometidas. Estas son las reflexiones que en el primer aniversario de su infausto gobierno he querido hacer llegar a los miembros de esa Junta, sin esperanza
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CARTAS PARA A POSTERIDADE
de ser escuchado, con la certeza de ser perseguido, pero fiel al compromiso
que asumí hace mucho tiempo de dar testimonio en momentos difíciles”.
Rodolfo Walsh,
Buenos Aires, 24 de marzo de 1977.
NOTAS:
1)Desde enero de 1977 la Junta empezó a publicar nóminas incompletas de nuevos detenidos y de
“liberados” que en su mayoría no son tales sino procesados que dejan de estar a su disposición pero
siguen presos. Los nombres de millares de prisioneros son aún secreto militar y las condiciones
para su tortura y posterior fusilamiento permanecen intactas.
2)El dirigente peronista Jorge Lizaso fue despellejado en vida, el ex diputado radical Mario
Amaya muerto a palos, el ex diputado Muñiz Barreto desnucado de un golpe. Testimonio de una
sobreviviente: “Picana en Ios brazos, las manos, los muslos, cerca de la boca cada vez que lloraba
o rezaba... Cada veinte minutos abrían la puerta y me decían que me iban hacer fiambre con la
máquina de sierra que se escuchaba”.
3)“Cadena Informativa”, mensaje Nro. 4, febrero de 1977.
4)Una versión exacta aparece en esta carta de los presos en la Cárcel de Encausados al obispo de
Córdoba, monseñor Primatesta: “El 17 de mayo son retirados con el engaño de ir a la enfermería
seis compañeros que luego son fusilados. Se trata de Miguel Angel Mosse, José Svagusa, Diana
Fidelman, Luis Verón, Ricardo Yung y Eduardo Hernández, de cuya muerte en un intento de fuga
informó el Tercer Cuerpo de Ejército. El 29 de mayo son retirados José Pucheta y Carlos
Sgadurra. Este úItimo había sido castigado al punto de que no se podía mantener en pie sufriendo
varias fracturas de miembros. Luego aparecen también fusilados en un intento de fuga”.
5)En los primeros 15 días de gobierno militar aparecieron 63 cadáveres, según los diarios. Una
proyección anual da la cifra de 1500. La presunción de que puede ascender al doble se funda en que
desde enero de 1976 la información periodística era incompleta y en el aumento global de la
represión después del golpe. Una estimación global verosímil de las muertes producidas por la
Junta es la siguiente. Muertos en combate: 600. Fusilados: 1.300. Ejecutados en secreto: 2.000.
Varios. 100. Total: 4.000.
6)Carta de Isaías Zanotti, difundida por ANCLA, Agencia Clandestina de Noticias.
7)“Programa” dirigido entre julio y diciembre de 1976 por el brigadier Mariani, jefe de la Primera
Brigada Aérea del Palomar. Se usaron transportes Fokker F-27.
8)El canciller vicealmirante Guzzeti en reportaje publicado por “La Opinión” el 3-10-76 admitió
que “el terrorismo de derecha no es tal” sino “un anticuerpo”.
9)El general Prats, último ministro de Ejército del presidente Allende, muerto por una bomba en
setiembre de 1974. Los ex parlamentarios uruguayos Michelini y Gutiérrez Ruiz aparecieron
acribillados el 2-5-76. El cadáver del general Torres, ex presidente de Bolivia, apareció el 2-6-76,
después que el ministro del Interior y ex jefe de Policía de Isabel Martínez, general Harguindeguy,
lo acusó de “simular” su secuestro.
10)Teniente Coronel Hugo Ildebrando Pascarelli según “La Razón” del 12-6-76. Jefe del Grupo
I de Artillería de Ciudadela. Pascarelli es el presunto responsable de 33 fusilamientos entre el 5 de
enero y el 3 de febrero de 1977.
11)Unión de Bancos Suizos, dato correspondiente a junio de 1976. Después la situación se agravó
aún más.
12)Diario “Clarín”.
13)Entre los dirigentes nacionales secuestrados se cuentan Mario Aguirre de ATE, Jorge Di
Pasquale de Farmacia, Oscar Smith de Luz y Fuerza. Los secuestros y asesinatos de delegados han
sido particularmente graves en metalúrgicos y navales.
14)Prensa Libre, 16-12-76.
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Rodolfo Jorge Walsh
CARTA A MIS AMIGOS
Hoy se cumplen tres meses de la muerte de mi hija, María Victoria,
después de un combate con fuerzas del Ejército. Sé que aquéllos que la
conocieron la han llorado. Otros, que han sido mis amigos o me han conocido
de lejos, hubieran querido hacerme llegar una voz de consuelo. Me dirijo a
ellos para agradecerles pero también para explicarles cómo murió Vicki y
por qué murió.
El comunicado del Ejército que publicaron los diarios no difiere
demasiado, en esta oportunidad, de los hechos. Efectivamente, Vicki era
oficial 2° de la Organización Montoneros, responsable de la prensa sindical,
y su nombre de guerra era Hilda. Efectivamente estaba reunida ese día con
cuatro miembros de la Secretaría Política que combatieron y murieron como
ella.
La forma en que ingresó a Montoneros no la conozco en detalle.
A los 22 años, edad de su posible ingreso, se distinguía por decisiones firmes
y claras. Por esa época comenzó a trabajar en el diario “La Opinión” y en
un tiempo muy breve se convirtió en periodista. El periodismo en sí no le
interesaba. Sus compañeros la eligieron delegada sindical. Cómo tal debió
enfrentar en un conflicto difícil al director del diario, Jacobo Timerman, a
quien despreciaba profundamente. El conflicto se perdió y cuando Timerman
empezó a denunciar como guerrilleros a sus propios periodistas, ella pidió
licencia y no volvió más.
Fue a militar a una villa miseria. Era su primer contacto con la
pobreza extrema en cuyo nombre combatía. Salió de esa experiencia convertida a un ascetismo que impresionaba. Su marido, Emiliano Costa, fue
detenido a principios de 1975 y no lo vio más. La hija de ambos nació poco
después. El último año de vida de mi hija fue muy duro. El sentido del deber
la llevó a relegar toda satisfacción individual, a empeñarse mucho más allá
de sus fuerzas físicas. Como tantos muchachos que repentinamente se
volvieron adultos, anduvo a los saltos, huyendo de casa en casa. No se
quejaba, sólo su sonrisa se volvía más desvaída. En las últimas semanas
varios de sus compañeros fueron muertos: no pudo detenerse a llorarIos. La
embargaba una terrible urgencia por crear medios de comunicación en el
frente sindical que era su responsabilidad.
Nos veíamos una vez por semana, cada quince días. Eran entrevistas cortas, caminando por la calle, quizá diez minutos en el banco de una
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plaza. Hacíamos planes para vivir juntos, para tener una casa donde hablar,
recordar, estar juntos en silencio. Presentíamos, sin embargo que eso no iba
a ocurrir, que uno de esos fugaces encuentros iba a ser el último, y nos
despedíamos simulando valor, consolándonos de la anticipada pérdida.
Mi hija no estaba dispuesta a entregarse con vida. Era una decisión
madurada, razonada. Conocía, por infinidad de testimonios, el trato que
dispensan los militares y marinos a quienes tienen la desgracia de caer prisioneros:
el despellejamiento en vida, la mutilación de miembros, la tortura sin límite en
el tiempo ni en el método, que procura al mismo tiempo la degradación moral,
la delación. Sabía perfectamente que en una guerra de esas características, el
pecado no era no hablar, sino caer. Llevaba siempre encima una pastilla de
cianuro, la misma con que se mató nuestro amigo Paco Urondo, con la que
tantos otros han obtenido una última victoria sobre la barbarie.
El 28 de setiembre, cuando entró en la casa de la calle Corro,
cumplía 26 años. Llevaba en brazos a su hija porque a último momento no
encontró con quién dejarla. Se acostó con ella, en camisón. Usaba unos
absurdos camisones blancos que siempre le quedaban grandes.
A las siete del 29 la despertaron los altavoces del Ejército, los
primeros tiros. Siguiendo el plan de defensa acordado, subió a la terraza con
el secretario político, Molina, mientras Coronel, Salame y Beltrán respondían
al fuego desde la planta baja.
He visto la escena con sus ojos: la terraza sobre las casas bajas, el
cielo amanecido, y el cerco. El cerco de 150 hombres, los FAP emplazados,
el tanque. Me ha llegado el testimonio de uno de esos hombres, un conscripto.
“El combate duró más de una hora y media. Un hombre y una
muchacha tiraban desde arriba. Nos llamó la atención la muchacha porque
cada vez que tiraba una ráfaga y nosotros nos zambullíamos, ella se reía.”
He tratado de entender esa risa. La metralleta era una Halcón y
mi hija nunca había tirado con ella, aunque conociera su manejo por las
clases de instrucción. Las cosas nuevas, sorprendentes, siempre la hicieron
reír. Sin duda era nuevo y sorprendente para ella que ante una simple pulsación
del dedo brotara una ráfaga y que ante esa ráfaga 150 hombres se zambulleran
sobre los adoquines, empezando por el coronel Roualdes, jefe del operativo.
A los camiones y el tanque se sumó un helicóptero que giraba
alrededor de la terraza, contenido por el fuego. “De pronto, dice el soldado,
hubo un silencio. La muchacha dejó la metralleta, se asomó de pie sobre el
parapeto y abrió los brazos. Dejamos de tirar sin que nadie lo ordenara y
pudimos verla bien. Era flaquita, tenía el pelo corto y estaba en camisón.
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Empezó a hablamos en voz alta pero muy tranquila. No recuerdo todo lo que dijo.
‘Ustedes no nos matan’ dijo ‘nosotros elegimos morir’. Entonces
se llevaron una pistola a la sien y se mataron enfrente de todos nosotros.”
Abajo ya no había resistencia. El coronel abrió la puerta y tiró dos
granadas. Después entraron los oficiales. Encontraron a una nena de algo
más de un año, sentadita en una cama, y cinco cadáveres.
En el tiempo transcurrido he reflexionado sobre esa muerte. Me
he preguntado si mi hija, si todos los que mueren como ella, tenían otro
camino. La respuesta brota de lo más profundo de mi corazón y quiero que
mis amigos la conozcan. Vicki pudo elegir otros caminos que eran distintos
sin ser deshonrosos, pero el que eligió era el más justo, el más generoso, el
más razonado. Su lúcida muerte es una síntesis de su corta, hermosa vida.
No vivió para ella: vivió para otros, y esos otros son millones.
Su muerte sí, su muerte fue gloriosamente suya, y en ese orgullo
me afirmo y soy yo quien renace de ella.
Esto es lo que quería decir a mis amigos y lo que desearía de ellos
es que lo transmitieran a otros por los medios que su bondad les dicte.
Rodolfo Walsh
Diciembre de 1976.
CARTA A DIREÇÃO NACIONAL DE
MONTONEROS
1. Durante 1976 el enemigo cumplió todos los objetivos de la Fase
2 de su Plan de Operaciones, pasó a la Fase 3 y se apresta en 1977 a
realizar la Fase 4, que denomina de exterminio.
2. En el último trimestre de 1976 el número de muertos en el
campo popular osciló entre 200 y 300 por mes.
3. Tras el aniquilamiento de la conducción del ERP en julio, el
enemigo concentró su esfuerzo en Montoneros. A partir de fines de
septiembre logró la destrucción de su Secretaría Política Nacional,
conducciones zonales, de La Plata y Norte, y muerte de un miembro de la
CN. Asestó fuertes golpes a las conducciones zonales de Sur, Oeste, Capital y estructuras de Prensa e Informaciones de AF. En el mismo período se
produjo la caída de numerosos oficiales, aspirantes y soldados. La Inteligencia
enemiga ha avanzado hacia un tipo de análisis estructural que le permitirá
en grado creciente la búsqueda de estructuras prioritarias de conducción o
Veredas do Direito, Belo Horizonte, ! v. 4 ! n. 8 ! p. 137-156 ! Julho - Dezembro de 2007
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del aparato federal. El conocimiento de la propia estructura le permite la
selectividad de los blancos y el volumen de caídas y confesiones obtenidas
por tortura facilita una renovación constante del ciclo de Inteligencia.
4. El presupuesto de guerra, superior a los mil millones de dólares
anuales, es el más alto de la historia. La PPBA ha sido reequipada, mejorando
notablemente en movilidad y armamento. La PF ha dado un salto cualitativo
en su sistema. de comunicaciones con la incorporación del sistema
DIGICOM.
5. El enemigo no experimenta carencia de personal y no ha
necesitado apelar a reservas tácticas o estratégicas. Los planes de
reclutamiento de PF se cumplen con anticipación.
6. La propaganda militar enemiga dispone de todos los medios de
difusión, que utiliza para pregonar el aislamiento de la guerrilla y su próximo
aniquilamiento, y para ocultar el fusilamiento de rehenes disfrazado como
enfrentamiento.
7. La moral de combate enemiga se ve realzada por la certidumbre
general de que el triunfo, sobre la guerrilla está próximo.
8. La evaluación sintética de esos elementos; es que la situación
militar enemiga es la mejor desde que en febrero de 1975 las FFAA asumieron
la conducción directa de las operaciones. La aparición de contradicciones
entre ellos gira sobre políticas a seguir después de la derrota de la guerrilla,
que sigue siendo el factor unificador.
9. Curso probable de acción enemiga, enero, junio 1977
* El enemigo iniciará sin dificultades la Fase 4 de su Plan de
Operaciones, lo que en términos generales significa una intensificación global de su ofensiva con vistas al triunfo antes de junio.
* En relación con la propia fuerza, el plan de operaciones del
enemigo apunta a la destrucción de las Construcciones Nacionales del Partido, aparatos federales de Finanzas, Informaciones, Logística y
Documentación, y conducciones zonales del Area Sur y Rosario.
Esta estimación del Departamento de Información no coincide
enteramente con el panorama militar del último documento del Consejo ni
con la estimación de CN, que llega a través de SN, según la cual la ofensiva
enemiga estaría llegando a su fin.
Rodolfo Walsh
Oficial de Inteligencia - Montoneros,
Buenos Aires, 23 de noviembre de 1976 a 2 de enero de
1977.
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SOMOS TODOS PALESTINOS
Emir Sader
Olhem as nossas caras. Olhem como estamos desvalidos.
Olhem como só dispomos de pedras e de uma vaga esperança de justiça.
Olhem como somos – crianças mortas, mães em prantos, mulheres viúvas,
filhos órfãos.
Olhem como nos imolamos por uma causa pela qual ninguém
dá nem um minuto do seu tempo.
Olhem como perdemos tudo – pátria, casa, oliveira, família,
terra, rua, braço, olhos. Olhem como amanhecemos chorando
e enterramos os mortos de ontem.
Olhem como nos preparamos para morrer hoje e amanhã.
Olhem como ninguém nos olha. Olhem como nos desumanizam.
Olhem como nos metralham.
Olhem como somos vítimas inertes diante dos fuzis automáticos.
Olhem como nos juntamos para os enterros,
para velar os nossos mortos, para gritar nosso desespero e nosso abandono.
Olhem os nossos olhos, olhem as nossas mãos, olhem os nossos filhos.
Olhem os muros com que nos cercam, olhem as máscaras com que se
escondem
nossos carrascos.
Olhem as mentiras dos seus porta-vozes, juntem raiva dos seus cínicos comunicados.
Agora fechem os olhos e nos imaginem tento uma pátria nossa,
como quase todos têm.
Imaginem-nos como nação, com nossa cultura, nossas ruas e casas,
nossos teatros e nossas oliveiras.
Fechem os olhos e vejam campos de paz, em que cruzam
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judeus, palestinos, cristãos, ateus – todos, seres humanos,
independentemente de sua religião, raça, idade, idioma.
Fechem os olhos e imaginem um mundo de paz no Oriente Médio,
com dois povos convivendo com fronteiras desarmadas,
sem passaportes, com templos de todos os credos convivendo
como um dia o fizeram em Toledo – de forma tolerante e solidária.
Fechem os olhos, mas nunca deixem de ver-nos como somos hoje
- dominados, ofendidos, humilhados, discriminados, explorados,
massacrados.
E lutem conosco por um mundo de paz,
De solidariedade, de tolerância, de fraternidade.
Nota:
Emir Sader, nascido em São Paulo, em 1943, é graduado em Filosofia pela Universidade de São
Paulo, onde fez Mestrado em Filosofia Política e Doutorado em Ciência Política.
Na USP, trabalhou como professor, primeiro de Filosofia, depois de Ciência Política. Foi pesquisador do Centro de Estudos Socioeconômicos da Universidade do Chile, professor de Política na
UNICAMP, coordenador do Curso de Especialização em Políticas Sociais na Faculdade de Serviço
Social da UERJ. É presidente da Associação Latino-Americana de Sociologia (ALAS), desde
1997, e coordenador do Programa de Estudos da América Latina e do Caribe, no Centro de
Ciências Sociais da UERJ, desde 1996. Dirige atualmente o Laboratório de Políticas Públicas na
UERJ, onde é professor de Sociologia. Dentre seus vários livros publicados, destacamos e indicamos: Século XX – Uma biografia não-autorizada. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2000;
O mundo depois da queda (org.). São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1995; Karl Marx – Bibliografia
(org.). Programa de Pós-Graduação do Departamento de Sociologia. São Paulo: FFLCH – USP,
1995; Vozes do Século (org.). São Paulo: Paz e Terra, 1997; Cartas a Che Guevara – O mundo
trinta anos depois. São Paulo: Ed. Paz e Terra, 1997; Nelson Mandela (org.). Ed. Revan, 1998;
e Contraversões – com Frei Betto. São Paulo: Ed. Boitempo, 1999.Este é um poema que não
precisaria de tradução, mesmo se estivesse escrito em árabe, hebraico, sânscrito ou javanês, todos
entendem sua dicção: chega de intolerância, de prepotência, de exploração, não só no Oriente
Médio, onde o império estadunidense patrocina a devastação, como em todo o mundo. Este é um
poema que não precisa de nenhuma nota, seja introdutória ou explicativa.
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