tradução “Los dos reyes y los dos laberintos”, de Jorge Luis Borges tradução de Ana Carolina Gomes da Silva jorge luis borges é um expoente da literatura argentina do século XX. Nascido em 1899, em Buenos Aires, Argentina, é desde cedo um leitor ávido e bilíngue. Educa-se na Suíça e é na Europa que conhece muitas de suas influências literárias. Foi poeta, contista, ensaísta, crítico literário e tradutor. Escreveu em colaboração com seu amigo pessoal e também escritor Adolfo Bioy Casares, além de outros autores, e fez parte da revista Sur, junto a Casares e Victoria Ocampo. Sua obra é vasta e variada, mas figuram com frequência construções acerca de bibliotecas, livros, labirintos, símbolos religiosos, em especial da cultura árabe e judaica e também figuras bastante conhecidas do sul da América Latina, como o gaúcho. Sua literatura é permeada pelo fantástico, fazendo parte da geração hispano-americana que deu visão ao realismo mágico. O conto aqui traduzido é parte do livro El Aleph, de 1949, onde temos novamente a questão do labirinto posta em cheque, ambientada num ambiente oriental e fabular, onde o autor nos apresenta uma belíssima reflexão acerca do tempo, da engenhosidade humana, e de seus desdobramentos labirínticos. los dos reyes y los dos laberintos Cuentan los hombres dignos de fe (pero Alá sabe más) que en los primeros días hubo un rey de las islas de Babilonia que congregó a sus arquitectos y magos y les mandó a construir un laberinto tan perplejo y sutil que los varones más prudentes no se aventuraban a entrar, y los que entraban se perdían. Esa obra era un escándalo, porque la confusión y primeiro semestre 2013 · Cisma · 83 la maravilla son operaciones propias de Dios y no de los hombres. Con el andar del tiempo vino a su corte un rey de los árabes, y el rey de Babilonia (para hacer burla de la simplicidad de su huésped) lo hizo penetrar en el laberinto, donde vagó afrentado y confundido hasta la declinación de la tarde. Entonces imploró socorro divino y dio con la puerta. Sus labios no profirieron queja ninguna, pero le dijo al rey de Babilonia que él en Arabia tenía otro laberinto y que, si Dios era servido, se lo daría a conocer algún día. Luego regresó a Arabia, juntó sus capitanes y sus alcaides y estragó los reinos de Babilonia con tan venturosa fortuna que derribó sus castillos, rompió sus gentes e hizo cautivo al mismo rey. Lo amarró encima de un camello veloz y lo llevó al desierto. Cabalgaron tres días, y le dijo: “¡Oh, rey del tiempo y substancia y cifra del siglo!, en Babilonia me quisiste perder en un laberinto de bronce con muchas escaleras, puertas y muros; ahora el Poderoso ha tenido a bien que te muestre el mío, donde no hay escaleras que subir, ni puertas que forzar, ni fatigosas galerías que recorrer, ni muros que te veden el paso.” Luego le desató las ligaduras y lo abandonó en mitad del desierto, donde murió de hambre y de sed. La gloria sea con aquel que no muere. os dois reis e os dois labirintos Contam os homens dignos de fé (mas Alá sabe mais) que nos primeiros dias houve um rei das ilhas da Babilônia que congregou seus arquitetos e magos e mandou-os construir um labirinto tão complexo e sutil que os varões mais prudentes não se aventuravam a entrar, e os que entravam perdiam-se. Essa obra era um escândalo, pois a confusão e a maravilha são operações próprias de Deus e não dos homens. Com o passar do tempo, veio à sua corte um rei dos árabes, e o rei da Babilônia (para zombar da simplicidade de seu hóspede) o fez penetrar no labirinto, onde vagou humilhado e confuso até o cair da tarde. Então implorou socorro divino e deu com a porta. Seus lábios não proferiram nenhuma queixa, mas disse ao rei da Babilônia que ele tinha outro labirinto melhor na Arábia e que, se Deus quisesse, ele o conheceria algum dia. Tão logo regressou à Arábia, juntou seus capitães e alcaides e arrasou os reinos da Babilônia com tão venturosa fortuna que derrubou seus castelos, aniquilou seu povo e fez cativo o mesmo rei. Amarrou-o em cima de um camelo veloz e levou-o ao deserto. Cavalgaram três dias e ele lhe disse: “Ó rei do tempo e substância 84 · Cisma · primeiro semestre 2013 e chave do século, na Babilônia quiseste perder-me num labirinto de bronze com muitas escadas, portas e muros; agora o Poderoso teve por bem que eu te mostre o meu, onde não há escadas para subir, nem portas para forçar, nem fatigantes galerias para percorrer, nem muros que te impeçam a passagem”. Em seguida desatou-lhe as ataduras e abandonou-o na metade do deserto, onde morreu de fome e de sede. Que a glória seja daquele que não morre. Referências bibliográficas borges, Jorge Luis. Obras completas I. Buenos Aires: Emecé. p. 607. nota 1. “Ésta es la historia que el rector divulgó desde el púlpito. Véase la pagina 601.” [Esta é a história que o reitor divulgou no púlpito (Cf. p. 601).] Essa página refere-se à edição da Emecé. A nota de rodapé aí presente faz referência ao conto Abenjacán el Bojarí, muerto en su laberinto, no qual se lê num determinado momento:“Nuestro rector, el señor Allaby, hombre de curiosa lectura, exhumó la historia de un rey a quien la Divinidad castigó por haber erigido un laberinto y la divulgó desde el púlpito”. primeiro semestre 2013 · Cisma · 85