Língua Barroca: - IME-USP

Anuncio
Língua Barroca:
Sintaxe e História do Português nos 1600
anexo documental
2
Dialogo em defensão da Lingua Portuguesa
Pero Magalhães de Gandavo
extraído das
Regras que ensinam a maneira de escrever
a orthographia da lingua portuguesa
Lisboa
Off. de Antonio Gonsalvez
1574
Esta versão:
Fac-simile digitalizado pela Biblioteca Nacional, Portugal
Gentilmente cedido por José Barbosinha
Segue fac-simile acompanhado de transcrição
[01]
Segue-se um diálogo em defesa da língua portuguesa, sobre a qual tem disputa
um Português com um Castelhano, onde por se tratar desta matéria usa cada
um de sua linguagem na maneira seguinte.
Petronio
Falencio
Interlocutores:
Português
Castelhano
Pet. Lembra-me, senhor Falencio, que os dias passados noa achamos em casa de
Flaminio nosso amigo,
[onde]
[02]
onde revolvendo certos livros de diversas linguagens, a que menos vos quadrou
e mais vituperastes, foi esta nossa Portuguesa de que todos praguejais, sendo
ela em si tão grave e tào excelente asim na prosa com no verso que só a latina
lhe pode nesta parte fazer vantagem. Quisera logo então (como sabeis) provarvos esta verdade, e mostrar-vos por razões claras quanto esta nossa excede à
vossa: mas porque o tempo nem o lugar eram para esta disputa, não fomos com
ela mais por diante. Pelo que assentamos (se vos lembra) de concluir esta
questão o primeiro dia que nos vissemos.
[Fal]
[03]
Falen. Por cierto señor Petronio que no es poco de agradecer el amor que en eso
mostrais a vuestra naturaleza. Porque siendo essa opinión tán contraria de
todos, y conocida vuestra lengua por la más tosca y grossera del mundo,
quereis defenderla y sustentar el contrario: lo que yo creo que [que] so será, sino
con algunas aparentes razones, o argumentos sofisticos de que suelen usar los
hombres sabios e de buenos ingenios para que se juzguen por buenas y
verdaderas sus opiniones.
Petro. Pouca necessidade tenho eu senhor Falencio, de buscar pera
[esta]
[04]
esta disputa argumentos dessa qualidade, havendo tantas e tão verdadeiras
razões que nesta parte me favorecem e com verdade posso alegar. Mas já que
temos movida esta questão, e o tempo nos dá lugar pera aconcluir, agora vos
peço me digais, qual é a razão que tendes pera julgar por tosca, e grosseira esta
nossa língua, que em extremo folgarei de a ouvir?
Fal. La causa señor Petronio, de vuestra lengua ser juzgada por essa (no solo de
todas las naciones del mundo, mas aun de los mismos Portugueses que la
posseen) es por que en su principio como se pue[de]
[05]
de ver en el lenguage de algunas historias y cronicas antiguas de Portugal,
usavan muchos vocabulos muy diferentes y improprios de su natural
significación y origen. Y después conociendo los hombres por el tiempo
adelante la impropriedad, y poca policia deste lenguage, vinieron poco a poco
apurandolo con derivar y componer vocabulos de diversas lenguas
ayuntandolos ala suya: y asi con favor delas agenas suplieron muchos defectos
que ella en si tenia. Por donde se no puede llamar verdadero Portugués el que
agora en estos tiempos usais, sino el antiguo que en principio se usava,
[como]
[06]
como ya tengo dito. Y por esso con razón llaman todos a esta lengua bárbara,
que en la realidad dela verdad lo és, pues de si es tán pobre, y tan poco polida,
que sin ayuda delas otras quedaria tan ruda y tosca, que en estos tiempos no se
poderia oír, ni aun entender delos mismos Portugueses.
Petro. Nessa opinião não consentirei eu, nem vós senhor Falencio devíeis de ir
com ela mais por diante: porque haveis de saber que esta nossa língua foi
inventada como foram as outras línguas. E se alguma nesta parte a favoreceu foi
a Latina, da qual todos estes
[nossos]
[07]
nossos vocábulos, ou a maior parte deles trazem sua origem. E assim a
linguagem que nesse antigo tempo se usava neste nosso Portugal a que vós
chamais tosca e ruda, está claro em muitos vocábulos ser mais chegada ao latim
que esta que agora usamos: porque hoje em dia há neste Reino lugares onde
ainda se usa deles como antigamente. Pelo que se pode afirmar com verdade
que não era outra coisa esta maneira de falar senão um latim corrupto. Mas
como a gente pelo tempo adiante fosse em crescimento, e os homens tivessem
necessidade de exercitarem esta língua em vários negócios,
[cada]
[08]
cada vez a foram mais apurando descobrindo nela outros vocabulos que ainda
que não são latinos como estes antigos que atrás deixamos, todavia soam
melhor aos ouvidos da gente polida, e são mais próprios e acomodados para
significarem aquilo que queremos, que outros que haja em nenhuma língua.
Ora naqueles em que seguimos o latim, não há que repreender, pois claramente
se vê que quanto mais a ele nos chegamos, tanto melhor parecem e mais
autorizada fica nossa linguagem. Pela qual razão se não pode negar ser este o
natural, e verdadeiro Português que
[agora]
[09]
agora usamos: no qual se desapaixonadamente quiserdes por os olhos, e notar a
etimologia e significação de alguns vocábulos desta nossa língua, achareis que
em muitas partes faz vantagem à vossa, como logo vos posso mostrar em um
nosso vocábulo que agora me lembra (além d'outros muitos que aqui não alego
por escusar prolixidade) e é que dizemos olhar, e vós mirar: pois se o
instrumento com que vemos chamamos olhos, com razão dizemos olhar e vós
chamais-lhe ojos, e dizeis mirar. O qual verbo não pode ser conveniente, nem
conforme a sua significação, sem dizerdes ojar, ou chamardes
[D aos]
[10]
aos olhos miros. Outras muitas impropriedades de vocábulos há desta maneira
em vossa língua que mui raramente ou nunca se acharão na nossa. E além disso
outros temos cá que vós lá careceis, sem os quais não podeis por nenhum modo
bem explicar aquilo que eles significam, comvém a saber, dizemos jeito,
saudade, lembranças, praguejar, enxergar, agasalhar, etc. E nós não carecemos
daqueles com que vós quereis significar estes e os mais que há. E por todas estas
razões, e outras muitas que alegarei, não se pode a esta nossa língua chamar
pobre nem grosseira, pos na realidade da verdade o não é, nem
[pessoa]
pessoa que sentir bem dela haverá que tal confesse.
[11]
FALENCIO: [Bein] Bien sé señor Petronio, que siempre en vuestras razones y
argumentos os aveis mostrado hombre de grande ingenio: mas aún que con el
pretendais escrever las mias, no dexaré de sustentar esta opinión de vuestra
lengua ser la que digo, hasta no ver contra mi otras más urgentes que me
obliguen a confessar el contrário. Y por esso os suplico me digais ya qye ella es
tan delicada y excelente como dezis, y tiene tanta gravedad en
[D2 su]
[12]
su estilo: qual és la causa porque todas las naciones del mundo la aborrecen
tanto, y la tienen en tan poco.
PETRONIO: A causa desse aborrecimento, e desprezo (ou por melhor dizer
inveja) senhor Falencio, naceu de ela ser em si tão dificultosa, que de maravilha
vimos estrangeiro algum que a pudesse bem tomar, ainda que neste Reino
andasse muitos anos, e trabalhasse pela aprender quanto humanamente fosse
possível. E daqui vem a todas as nações aborrecerem-na tanto, e não a poderem
[gostar]
gostar, por lhes ser (como digo) tão pouco fácil, e de tão ruim desistam.
[13]
FALENCIO: Luego si assi és, muy mejor es la Castellana y más util a todos:
pues no hay nación en el mundo que no la tome con mucha facilidad, y la tenga
en mucho más estima que la vuestra, la qual con razón se deve llamar grossera
y tosca, ya que és tan escabrosa y difícil de tomar, que no aprovecha a nadie el
uso della sino a sus naturales.
PETRONIO:: Antes uma das provas que eu tenho
[D3 de ela]
[14]
de ela ser melhor, e muito mais delicada que a vossa, é por essa dificuldade que
vós lhe achais, porque vemos por experiência que quanto as coisas em si são
melhores, e mais excelentes, tanto é mais trabalhoso e difícil ao homem
alcançar-las. Quanto mais se esta nossa língua fora dificultosa por causa de ser
bárbara, e grosseira, de crer é, que a mesma dificuldade tivéramos em tomar as
outras línguas, que têm os estrangeiros em tomar a nossa. Mas pelo contrário é
ela tal, e de tanta preeminência, que a todos os naturais habilita e dispõe de
maneira, que em pouco tempo e com muita facilidade (como cla[ramen]
[15]
ramente se vê por experiência) tomam qualquer língua estranha, e nisto fazem
vantagem a todas as outras nações.
FALENCIO: Esso no niego yo, ni dexo de conocer, señor Petronio, la razón que
en essa parte teneis: porque he visto muchos Portugueses en Castilla hablar
nuestra lengua, como si fuera de su naturaleza suya. Y en Italia por el
conseguinte algunos vi de que en ella no difirian de los mismos Italianos. Mas
esso también se puede referir a sus [buenos]
[D4 inge-]
[16]
buenos ingenios y habilidades que tienen de su naturaleza, y no a la disposición
de su lengua.
PETRONIO: Dizei-me senhor Falencio, se um homem não for bom músico, e
tiver ruim voz, por muito hábil, e sentido que seja, poderá bem contrafazer a
outros quaisquer músicos que ouça?
FALENCIO: Esso mal podrá ser, si el no tiene voz que le ayude.
PETRONIO: Pois de crer é, que se os Portugueses tiveram ruim língua, e fora
tão grosseira como dizem, que não contrafizeram com ela também as outras
[línguas]
línguas, nem lhes aproveitára nesta parte seu bom engenho.
[17]
FALENCIO: Pues señor Petronio, ya que essa gracia és atribuida a la capacidad
de vuestra misma lengua, y por virtud della sois tan habilíssimos en tomar las
agenas, qual es la causa porque los mismos Portugueses siendo ella suya la
desdeñan, y por su boca confiessan ser ella la más tosca y barbara del mundo?
PETRONIO: A isso vos respondo, senhor Falencio, que esta nação Portuguesa
pela maior parte, é mais afeiçoado às coisas dos outros Reinos, que às da sua
mesma natureza, coisa que se não
[acha]
[18]
acha nas outras nações: porque todas engrandecem sua língua, e fazem muito
pelas coisas que quadram nela, sós os Portugueses parece que negam nesta
parte o amor à natureza. E daqui vem a muitos dizerem mal de sua língua, e
consentirem na opinião dos estrangeiros, o que realmente se pode atribuir mais
a ignorância, que a razão alguma que a isso os mova. Porém os homens de bom
juizo que bem a sentem, não podem deixar de engrandecer muito, e confessar
comigo que a ela se deve mais louvor que à vossa.
FALENCIO: Creo yo señor Petronio, que de[ven]
[19]
ven ser muy pocos o quiçá ningunos, los que quieran assentir con vós en essa
opinión. Porque hombres Portugueses muy principales y de grandes ingenios,
escrivieron, y aún hoy día escriven sus obras en Castellano por ser lenguage
más aprazíble y dulce, y sonar mejor a los oydos que la vuestra: y esto és tán
notorio y manifesto, que hasta los niños vuestros naturales conocen y confiessan
esta verdad.
PETRONIO: Não é bastante razão esta que alegais para que vossa língua por
esse respeito mereça ser preferida à nossa,
[Porque]
[20]
Porque haveis de saber que cada língua por si tem um estilo mais próprio, e em
que melhor parece, como é, a Grega nos versos, a Latina nas orações, a Toscana
nos sonetos, a Portuguesa nas comédias em prosa e no verso heróico, a
Castelhana nas trovas redondas e garridas que naturalmente parecem feitas e
inventadas para ela. E daqui veio a muitos Portugueses vendo quão bem
parecia neste estilo, e que nela se achava mais facilmente consoantes para verso,
exercitarem-na por seu passatempo em églogas, canções, elegias, e cantos
pastoris que são matérias leves, e acomodadas ao estilo da mesma língua. Mas
coisas graves,
[e]
[21]
e de importância, não me dareis nenhum Português antigo nem moderno que as
tratasse nem escrevesse em vossa língua. E se quereis saber quão pouca
necessidade temos dela, vede o estilo das comédias e dos versos do nosso
verdadeiro português Francisco Sá de Miranda, que foi o primeiro nesta nossa
Lusitânia que o descubriu com tamanha admiração, que de todos em geral ficou
confessada esta verdade. Vede a Ásia daquele famoso e excelente escritor João
de Barros que por ela em Veneza está preferido a Ptolomeu. Vede a primeira e
segunda parte da Imagem da vida Cristã daquele doutíssimo varão Frei He[ctor ]
[22]
ctor Pinto que agora em nossos dias saiu a luz: Vede o estilo da linguagem de
Lourenço de Caceres, de Francisco de Moraes, de Jorge Ferreira, de Antonio
Pinto, e d'outros ilustres varões que na prosa tanto se assinalaram, descobrindo
com seus engenhos peregrinos o segredo da gravidade e formosura deste nosso
Português. Pois se no verso heróico vos parece que a vossa lhe pode fazer
vantagem: vede as obras do nosso famoso poeta Luis de Camões de cuja fama o
tempo nunca triunfará, vede a brandura das daquele raro espírito Diogo
Bernardes: vede finalmente as do doutor Antonio Ferreira de quem
[o mun-]
[23]
o mundo tantos louvores canta: e em cada[da] um destes autores achareis um
estilo tão excelente, e tão natural e acomodado a esta nossa língua, que
forçadamente haveis de vir a descer-vos de vossa opinião, e confessar comigo
ser ela indigna desse nome que vós lhe dais. Pois se quereis ver a língua de que
é mais vizinha, e de onde manou, lede a arte da gramática da língua Portuguesa
que o mesmo João de Barros fez, e o mesmo podeis ver no livro da antiguidade
de Évora de Mestre André de Resende, onde claramente se mostra, que com
pouca corrupção deixa de ser Latina.
[Enfim]
[24]
Enfim que se alguma com razão se pode chamar bárbara é a vossa, a qual toma
da língua Arábia, e a maior parte dos vocábulos falais do papo com aspiração: e
assim fica uma linguagem imperfeita, e mais corrupta do que vos dizeis que a
nossa é.
FALENCIO: Pues señor Petronio, ya que con el artefício de viestras razones
quereis ahoga, y confundir las mias, y piensais quedar vencedor, y triunfar de
my opinión: agora os quiero provar en como la nuestra lengua es más
propinqua al latin que la vuestra, con algunos vocabulos que aqui ofereceré,
conviene a saber. Decís hontem, nós hayer, el latin heri.
[Decís]
[25]
Decís engenho, nós ingenio, el latin ingenio. Decís dores, nós dolores, el latin
dolores. Decís cores, nós colores, el latin colores. Decís calmas, nós calores, el
latin calores. Decís paixões, nós passiones, el latin paisiones. Decís pessoa, nós
persona, el latin persona. Enfin otros muchos vocábulos há en nuestra lengua,
que diferen muy poco, o quasi nada dela [la] latina, de los quales la vuestra es
muy remota, como en estos os tengo mostrado. Pues como la lengua Latina sea
madre de las otras lenguas, y más copiosa y excelente de todas quantas hay
(como sabemos) aquella que más semejante y propinqua fuere a ella, essa será
mejor y más singular que las otras.
[E Se]
[26]
PETRONIO: Se com essa razão vos parece, senhor Falencio, que tendes
concluido, ainda vos provarei que a nossa é mais chegada ao latim que a vossa,
como se pode ver em outros muitos vocábulos nossos de que a vossa também se
desvia: alguns deles são estes que se seguem. Vós dizeis lengua, nós lingua, o
latim lingua. Dizeis pluma, nós penna, o latim penna. Dizeis t~eprano, nós
cedo, o latim cito. Dizeis lexos, nós longe, o latim longe. Dizeis años, nós
annos, o latim annos. Dizeis daño, nós damno, o latim dano. Finalmente, que se
quantos me ocorrem vos quisesse aqui dizer, seria coisa infinita de nunca
acabar,
[porque]
[27]
Porque (como digo) a maior parte dos vocábulos pronunciais com aspirações,
por onde fica vossa língua muito mais remota e desviada do latim que a nossa: e
senão vede-o nestes que agora vos direi. Vós dizeis hembra, nos femia, o latim
femina. Dizeis hierro, nós ferro, o latim ferro. Dizeis hiel, nós fel, o latim fel.
Dizeis hado, nos fado, o latim fato. Dizeis huir, nós fugir, o latim fugere. Dizeis
hazar, nós fazer, o latim faccere. Pois daqui podeis inferir quanto melhor, e mais
grave é a nossa língua: e se quiserdes saber quanto nesta parte excede não
somente a vossa, mas ainda às outras de que não tratamos, a este propósito vos
contarei, que um dia em Paris se a[E2 chá]
[28]
charam numa certa parte homens de diversas nações, os quais vieram a disputar
de suas línguas, e cada um fez versos em latim buscando vocábulos mais
semelhantes a sua, e nenhuma se achou que mais participasse do latim que a
nossa: porque dez ou doze versos se fizeram, que não discrepam da língua
latina coisa alguma, nem da Portuguesa: dos quais me lembram estes que se
seguem.
O quam diuinos acquiris terra triumphos,
Tam fortes animos alta de forte creando
De numera sancto gentes tu firma reseruas
Per longos annos uiuas tu terra beata
Cõtra um sanctos te armas furiosa Paganos
Viuas tu semper gentes mactando feroces,
Que ehipas Turcos forte tudo dás saluos
De Teju Christosactos mostrãdo Prophetas.
[29]
Ficaram todos tão enleados quanto nestes versos viram a perfeição desta lingua,
que não poderam deixar de a confessar por melhor, e mais chegada ao latim de
todas. E assim também vós senhor Falencio, devíeis de cair na conta, e acabar de
conhecer que por todas as vias é ela mais polida e delgada que a vossa.
FALENCIO: Aunque con todas esas razones os paresca que aveis provado
fuerça contra las mias, con todo eso no creo señor Petronio, que totalmente sean
bastantes para deshacer mi opinión. Porque supuesto que en esos versos
[se]
[30]
se muestre vuestra lengua tan cerca del latin, también se de espacio
pensassemos en la nuestra, podria ser que hallassemos vocabulos con que
hiciessemos otros tantos, o más en nuestro lenguage, y tan latinos como esos
que aveis alegado.
PETRONIO: Não me parece, senhor Falencio, que será possível achardes
vocábulos tão perfeitamente latinos nem que tão bem pareçam em vossa
linguagem, que vos sirvam para versos desta qualidade.
FALENCIO: Y que razon averá, señor Petronio, para que tan perfectamente los
no hallemos en la nuestra, avendo entre ambas de una a la otra tan poca
diferencia?
[porque]
[31]
PETRONIO: Porque além de as aspirações que usais vos corromperem (como já
disse) a semelhança que a vossa língua podia ter com a Latina, tendes nela
muitas sílabas que se dobram por duas letras vogais, que o latim nem nós nunca
usamos: como é, tierra, fuerte, muerte, fuerte, luengo, cierto, e outros infinitos
vocábulos, nos quais a nossa segue o latim, e não discrepa dele coisa alguma, e a
vossa totalmente parece que neles se esmerou em se desviar dele, como se desta
maneira ficasse mais perfeita.
FALENCIO: Ora señor Petronio, vos lo teneis muy bien hecho, y hasta aqui
dispu[tado]
[32]
tado sabiamente como hombre de grande ingenio, y que no desea poco
engrandecer las cosas de su naturaleza. Y por eso demos fin a nuestra disputa, y
seamos amigos como siempre lo fuimos, que lo demás poco nos importa.
PETRONIO: Dessa maneira, senhor Falencio, já que contra minhas razões não
tendes mais que arguir, e o campo fica por meu, demos por concluída nossa
questão, que isto é tarde, e vão-se fazendo horas. Por isso não me detenho mais,
ficai-vos embora que outro dia nos veremos.
Fim.
Descargar