348 PERFIS DO MEDIADOR SÓCIO-EDUCATIVO

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Actas do X Congresso Internacional Galego-Português de Psicopedagogia. Braga: Universidade do Minho, 2009
ISBN- 978-972-8746-71-1
PERFIS DO MEDIADOR SÓCIO-EDUCATIVO - ENTRE A DIVERSIDADE,
ALGUMAS CONVERGÊNCIAS1
Ana Paula Caetano, Isabel Freire & Ana Sousa Ferreira
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[email protected]; [email protected];
Resumo
A análise das respostas de 225 mediadores sócio-educativos a perguntas de um questionário sobre
competências e princípios orientadores da sua prática, parecem apontar para a emergência de tipos de
perfil profissional, associados a concepções teóricas sobre a mediação. Procuraremos, ainda, cruzar
estes dados com os diferentes contextos de intervenção. Na presente comunicação apresentamos os
resultados e algumas pistas de interpretação que salientam convergências e diversidades neste campo
de acção social.
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Introdução
O que é ser mediador sócio-educativo? Como é que aqueles que desempenham funções de
mediação, mesmo que não tenham tido qualquer formação específica para o efeito, vêem o seu
papel? Que competências consideram importante para a realização do seu trabalho? Serão estas
perspectivas relacionadas com os seus contextos profissionais?
Com base nestas questões de partida tentaremos compreender um pouco mais o que se passa, a
nível do nosso país, com este campo de actuação. Temos, até agora, avançado com estudos de
caso, de índole qualitativa, para perceber pequenos nichos, em diferentes contextos (Caetano,
2005; Caetano e Freire, 2004, 2006; Freire, 2006, 2007; Freire e Caetano, 2005, 2008; VianaCaetano, 2006). Mas, parece-nos ser tempo de um estudo em maior extensão, que envolva o
máximo de mediadores no terreno. A teoria é prolixa em referências a competências, a valores,
a cuidados na acção, a atitudes desejáveis para o mediador. Conceptualmente, são diversos os
autores que têm procurado cartografar paradigmas e modelos de mediação. Mas parece-nos
importante cruzar essas concepções teóricas com as concepções dos práticos. É nesse sentido
que se orienta a presente comunicação.
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Perspectivas de mediação e perfil do mediador
Ao fazer um estudo sobre as competências do mediador não procuramos apenas elencar as
competências consideradas importantes pelos inquiridos. Mais do que enumerar elementos
avulsos, interessa-nos perceber se estes se agregam em torno de alguma lógica, de alguma
concepção coerente. Daí o recurso às perspectivas teóricas que nos podem ajudar a encontrar
inteligibilidade no conjunto das respostas.
Umas das possíveis entradas poderá ser equacionada em torno da tipologia de Jares sobre o
conflito (2002), transporta para o campo mais amplo da mediação (Caetano, 2005), e pela qual
se podem considerar três grandes perspectivas: a tecnocrática, a interpretativa e a crítica,
perspectivas essas que tendem a conjugar visões éticas, epistemológicas e práticas distintas. A
perspectiva tecnocrática, enformada por modelos lineares e apriorísticos de resolução de
problemas,
parece
entender
as
questões
do
profissionalismo
numa
orientação
predominantemente deontológica, pautando-se por princípios e valores de rigor e eficácia.
Numa linha positivista assume a neutralidade do mediador. Centra-se nas questões
procedimentais da mediação, não sendo particularmente sensível à introdução da flexibilidade e
da criatividade nos encontros de mediação.
Ao invés, a perspectiva interpretativa-hermenêutica dá ênfase ao encontro na sua singularidade,
pelo que isso implica uma relação que permanentemente se constrói. Para tal, o mediador
precisa, acima de tudo, de ser competente nessa relação aberta, visando, numa linha teleológica
e isomórfica, o desenvolvimento das relações e da comunicação daqueles com quem trabalha.
Esta visão contextualística conjuga-se com alguns princípios éticos que, numa linha
deontológica, orientam no sentido do respeito, da solidariedade, da cooperação. As
competências que assim se valorizam poderão ser sobretudo as da escuta e do diálogo.
A perspectiva crítica foca-se na emancipação social, numa transformação pela qual a sociedade,
as comunidades, as instituições e as pessoas saem reforçadas no seu poder e autonomia, na
liberdade de serem elas próprias, na construção da sua identidade cultural (Boqué Torremorell,
2008). Consonante com estes propósitos, desenha-se uma ética fortemente teleológica, orientada
por princípios de justiça equitativa e finalidades de coesão social. A neutralidade do mediador é
substituída por um comprometimento deste com o bem social.
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Contextualização
O presente trabalho inscreve-se num projecto de investigação que visa compreender o perfil
profissional dos mediadores sócio-educativos em Portugal, analisando os seus contextos de
trabalho, as suas funções, as competências consideradas importantes, a sua formação. Para isso,
elaborou-se um questionário, com base em entrevistas a mediadores e em revisões da literatura
sobre o tema. Nesta comunicação problematiza-se o perfil de competências do mediador, a
partir da análise das respostas de 225 mediadores sócio-educativos, a trabalhar em diferentes
zonas de Portugal continental, inseridos em programas e projectos de diversa natureza, tais
como escolas e agrupamentos de escolas, associações comunitárias, apoiados por entidades
como o Alto Comissariado para o Diálogo Intercultural (ACIDI); o Plano Integrado de
Educação Formação (PIEF), o Instituto de Apoio à Criança (IAC).
Metodologia
Foi utilizada uma metodologia mista, pois que se combinaram estratégias de análise estatística
(para os dados recolhidos através de uma escala de Likert, em que se pedia aos respondentes
para classificarem os itens correspondentes a indicadores de competências dos mediadores) e
análise de conteúdo (para os dados relativos às respostas a perguntas abertas do questionário2).
Na análise estatística dos dados quantitativos recorreu-se a análises de dados multivariadas: um
modelo de Análise Classificatória Hierárquica Ascendente (ACHA) (Coeficiente de correlação
de Spearman, Critério da ligação completa (ou do vizinho mais longínquo)) e a Análise das
Ordens (AO), uma análise factorial para dados ordinais. Estes tipos de análise visaram encontrar
classes (clusters) e factores, que nos vieram permitir definir as classes de variáveis mais
semelhantes (análise classificatória) e os factores fundamentais que explicam o fenómeno da
mediação em estudo através da análise das correlações entre variáveis e factores (análise
factorial).
No que diz respeito à análise de conteúdo dos dados de natureza qualitativa, recolhidos através
de uma questão de resposta aberta, a resposta de cada sujeito constituiu uma unidade de registo,
sendo portanto cada resposta analisada na sua totalidade. Uma análise mais fragmentária
perderia estes conglomerados e não nos permitira analisar tendências individuais no que respeita
aos seus princípios e possíveis perspectivas subjacentes. Aqui não pretendemos uma análise
estatística semelhante à operada a respeito da escala de Likert, tão grande é a diversidade de
itens usados, nem sequer proceder a uma análise de conteúdo sistemática de todas as respostas,
dada a sua complexidade e a incerteza quanto à validade destas interpretações, mas pretende-se
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tão só apontar para tipos de agrupamentos que parecem dar conta da diversidade de
posicionamentos dos mediadores questionados.
Uma análise estatística do perfil de competência
A análise classificatória das respostas aponta para três grandes classes. Uma delas é constituída
por itens que respeitam a um conjunto de competências, atitudes, cuidados, princípios e valores
que, na sua maioria, enfatizam um modo de agir centrado no mediador, com uma intervenção
activa na resolução de problemas e de conflitos. Organizam-se nesta classe os seguintes itens:
29 - tentar resolver os problemas o mais depressa possível; 33- saber resolver os conflitos dos
outros; 32- ser falador; 11- ser auto-confiante; 36- ser muito activo; 31- ser simpático; 7- ser
prudente; 27- ser perseverante; 25- ser optimista; 26- interessar-se pelo bem dos outros.
Trata-se de um conjunto de atitudes e competências (mais as primeiras que as segundas) que
parecem estar mais associadas a um certo activismo, pragmatismo, ou mesmo imediatismo, não
deixando contudo de se pautar por uma orientação para o bem comum (
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Uma outra classe integra itens que enfatizam uma linha de intervenção centrada na comunicação
e na relação, numa linha de intervenção que se aproxima de uma perspectiva interpretativahermenêutica (Jares, 2003).
Organizam-se nesta classe os seguintes itens:
4- ser responsável; 8-ser capaz de identificar problemas; 6-ser capaz de ouvir os outros;
18- respeitar o outro; 34-ser bom observador /estar atento ao que o rodeia; 10- ser assertivo; 14ser imparcial; 12- ser empático na relação com os outros; 35- estar motivado para aquilo que
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Trata-se de um conjunto de aspectos que acentuam um posicionamento de abertura às situações
concretas, aos contextos, às pessoas, pelo que o encontro se torna possível. O mediador está
presente sobretudo na escuta e na receptividade, pelo se orienta para a criação de condições
pelas quais os outros desenvolvem processos de auto e hetero-análise e de busca de soluções
para os seus problemas / conflitos.
Por fim, uma terceira classe inclui itens centrados em questões comunitárias e interculturais, e
que tendo que lidar com confrontos e conflitos que muitas vezes envolvem grupos, têm de ser
resilientes para lidar com o stress, a frustração, as adversidades e mesmo a violência. O humor,
a criatividade, a paciência, o auto-controle constituem competências importantes para lidar com
este tipo de situações. Poderá projectar-se uma orientação deste tipo de intervenção para
finalidades emancipatórias e de coesão social, numa linha próxima de uma perspectiva crítica.
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Organizam-se, nesta classe, os seguintes itens:
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24- ser resistente às adversidades; 21- ser tolerante ao stress;
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-ser corajoso; 13- ter sentido de humor;
15 - acreditar no outro; 16 - promover o diálogo entre pessoas ou grupos.
Estas classes são corroboradas parcialmente por uma análise factorial, na qual analisamos 5
factores, o primeiro dos quais, de ordem muito geral, aponta para competências auto, do tipo
processual, parcialmente centradas na resolução de problemas. O 2º factor é caracterizado pelos
itens da ordem da relação interpessoal e da comunicação (ser capaz de ouvir os outros, ser
assertivo, ser empático, promover o diálogo e respeitar o outro) que se opõem a um conjunto de
valores negativos na mediação (ser falador, procurar resolver problemas depressa e ser
simpático). O 3º factor agrega um conjunto de itens que correspondem a uma abertura para as
situações e para o outro (estar disponível, ser flexível, ser responsável e ser capaz de ouvir os
outros) que se opõem a itens centrados no domínio de códigos culturais. Os quarto e quinto
factores são menos expressivos, com itens com correlações/pesos baixas, o quarto apontando
para uma sensibilidade aos contextos e o último para itens como o humor.
Parece, pois, que a análise classificatória e a análise factorial concorrem na identificação de
perfis
de competências
marcantes
(auto-centrado e
pragmático; comunicacional
e
comunitário/transformativo). A análise factorial permite ainda concluir que o primeiro destes
perfis parece não co-habitar com o último, ou seja, os mediadores que valorizam o pragmatismo
e o activismo do mediador na resolução de problemas, dificilmente valorizam as competências e
atitudes necessárias a uma abordagem comunitária, intercultural e transformadora. Pelo
contrário, parece apontar para uma complementaridade, ou pelo menos, não oposição entre o
perfil comunicacional e os outros dois.
Numa tentativa de articular estas dimensões do perfil profissional com os contextos
profissionais, procurámos analisar, através do teste de qui-quadrado de independência, as
relações entre classes de contextos (contexto institucional e tipos de mediação) e as classes
apuradas na análise classificatória das competências. No entanto, estas análises não se revelaram
estatisticamente significativas, não sendo possível caracterizar os mediadores de cada contexto
por um qualquer sentido identitário que se agregue em torno de um conjunto de competências.
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Princípios considerados fundamentais
A análise dos registos dos mediadores a uma pergunta aberta acerca dos três princípios
considerados fundamentais levam-nos ao aprofundamento complementar das análises
estatísticas à escala de Likert anteriormente apresentadas.
Sendo uma questão que se orienta para elementos de ordem deontológica (princípios de acção),
verificamos que as respostas são mais diversificadas, algumas das quais remetem para
competências, atitudes e cuidados e outras para finalidades, mais do que para princípios.
Também muitas das vezes as respostas não têm um foco único - em processos de resolução de
problemas, nas relações interpessoais ou no desenvolvimento social das comunidades - , mas
são híbridas, conjugando diversos desses conteúdos. Também se verifica uma conjugação de
uma orientação ética deontológica e uma orientação mais contextualística e teleológica, no
conjunto das respostas, embora alguns mediadores pautem as suas respostas exclusivamente por
uma destas orientações.
Um conjunto substancial de respostas está centrada na relação e na comunicação, com uma
orientação quer deontológica quer contextualística, onde os enunciados apontam para princípios,
valores, finalidades, atitudes e competências interpessoais. Veja-se a título de exemplo, os
seguintes enunciados:
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Surgem outras respostas que se podem inscrever numa linha ética deontológica, que aponta para
valores preponderantes na literatura conotada com um modelo tecnocrático e que organiza
princípios, atitudes e competências gerais, procedimentais e pessoais, vejamos algumas dessas
respostas, a título ilustrativo:
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De um modo muito menos frequente, surgem respostas que parecem centrar-se numa
intervenção comunitária e apontar sobretudo para uma perspectiva crítica e emancipatória,
centrada na coesão e transformação social, com orientação predominantemente contextualista e
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enformada em valores, finalidades, atitudes e competências culturais, linguísticas, reflexivas.
Eis algumas dessas respostas:
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Mas a maioria dos enunciados integra diversos focos e conteúdos e diversas orientações éticas,
pelo que parecem sobressair tendências não puristas, híbridas. Destas, destaque para aquelas que
parecem conjugar uma perspectiva tecnocrática e interpretativa, onde a resolução de problemas
e a comunicação são dimensões relevantes em torno das quais se delimitam princípios,
finalidades, atitudes, competências e cuidados de actuação. Tal parece ser o caso das seguintes
respostas:
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desempenho profissional (tolerância, empatia, altruísmo, equilíbrio, controlo)
As perspectivas focadas na relação e na comunicação, numa linha predominantemente
interpretativa, e as perspectivas focadas no social e na comunidade, numa linha que se parece
situar numa perspectiva crítica e emancipatória também se combinam, embora de modo menos
expressivo que a anterior combinatória.
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implementação e execução de projectos, ser capaz de gerir a comunicação interpessoal, ser
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Surgem, ainda, respostas tão híbridas que conjugam todas as vertentes consideradas, pelo que
não são tipificáveis numa dada tendência conceptual.
Em articulação com os modelos teóricos de mediação (Suares, 1996), é também interessante
constatar algumas respostas que se inscrevem claramente num modelo transformativo (Folger e
Bush, 1999), orientado para a capacitação, reconhecimento e consciência individuais e
colectivos. São respostas que por vezes escapam aos eixos de análise anteriormente utilizados.
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decisões em conjunto, promover a participação activa do aluno e respectiva família na
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outro valores, competências e espaço potencial p
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mútuo, valorização pessoal de cada um, contribuindo para um processo de evolução.
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estratégias junto das crianças e jovens, para que haja uma boa integração no grupo, proporcionar
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rece significar a integração das dimensões de
intersubjectividade, numa perspectiva construtivista, parecendo por vezes centrada numa
abordagem de coordenação interinstitucional assente numa racionalidade instrumental (Correia,
2006).
Considerações finais
Com este projecto de investigação pretendemos contribuir para um melhor conhecimento da
mediação social e, em particular daquela que se desenvolve em contextos educativos (tanto de
natureza formal como informal). Tentámos, por isso, nesta fase do projecto realizar um estudo
em extensão, através da aplicação de um questionário, abrangendo grande parte dos mediadores
sócio-educativos, ligados por relações laborais institucionalizadas a organizações sociais
espalhadas pelo país. Este texto dá conta de alguns dos aspectos desta realidade. Numa primeira
constatação, observa-se que esta actividade sócio-profissional é desempenhada por pessoas
jovens e com elevado nível de formação académica, tendo alguns deles formação especializada
em mediação. Estes aspectos não são concerteza despiciendos para a compreensão dos perfis de
acção e de pensamento ético que acabamos de descrever e de problematizar. Estamos a analisar
uma população sócio-profissional que opera em áreas de intervenção sócio-cultural de uma
grande exigência em termos da sua formação pessoal e profissional. Num mundo pautado pela
complexidade das relações pessoais, grupais, institucionais, culturais, cada vez se torna mais
evidente a importância, para promoção da coesão e do bem-estar social, deste tipo de
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profissionais, a que alguns chamaram linkworkers, (Molina, Gailly, Giménez & Guest, 2001).
A análise e interpretação dos dados que produzimos são reveladoras da complexidade da função
do mediador. Apoiando-nos nos modelos e perspectivas teóricas comummente aceites na
literatura sobre mediação, constatámos que, quer no que respeita à valorização das competências
e atitudes, quer aos princípios e valores que enformam a sua acção, estes 225 mediadores não se
circunscrevem a um referencial puro. Verifica-se, contudo, que a orientação para a relação e a
preocupação com o bem comum parecem ser dimensões transversais ao pensamento dos
mediadores, o que poderá justificar-se pela própria formação de base (áreas de psicologia,
educação, serviço social e sociologia, predominantes). Por outro lado, esta orientação parece ser
aquela que se apresenta como complementar e integradora em relação às outras abordagens.
Nesta nova área profissional, como diz Yazebek (
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explicar a riqueza de práticas e de orientações para as mesmas. Poderemos, contudo, também
hipotetizar que a mobilização de uma orientação mais tecnocrática, mais hermenêutica, mais
transformativa ou mesmo uma orientação mais activista ou imediatista, poderá explicar-se pelas
próprias exigências de cada situação de mediação.Ta
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onsentâneos com determinados eixos daqueles
referenciais. Esta circunstância poderá estar associada quer a um nível de formação mais
aprofundado e consistente, quer a experiências profissionais vividas e a oportunidades de
aprendizagem que estas proporcionam. Apesar de no nosso estudo não observarmos nenhuma
relação entre os contextos e o pensamento sobre a acção, observando-se apenas algumas
tendências que não explorámos, dada a sua fragilidade, pensamos que num futuro estudo, o
alargamento do número de sujeitos nos poderá permitir outro tipo de compreensão sobre esta
dimensão tão importante da problemática.
Notas
1
A produção deste texto enquadra-se num projecto de investigação, intitulado Formações e Aprendizagens ao
Longo da Vida: Saberes, Experiências e Identidades, financiado pelo Centro de Investigação em Educação
(CIEd), no âmbito da linha de i
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Refira três dos princípios fundamentais em que baseia
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