Semiologia Cardiovascular Ciclo Cardíaco por Cássio Martins

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Semiologia Cardiovascular
Ciclo Cardíaco
por Cássio Martins
Introdução
A função básica do coração é garantir a perfusão sanguínea dos tecidos
periféricos e o aporte sanguíneo para os alvéolos de modo a permitir a troca gasosa.
Essa função é realizada através da ejeção de volumes de sangue na grande e na
pequena circulação, respectivamente. Portanto é aceitável dizer que o coração é uma
“bomba”, que ao se contrair “bombeia” o sangue para a periferia, e ao relaxar se enche
novamente de volume. Essas duas fases, de contração e relaxamento, chamados de
sístole e diástole, respectivamente, são consideradas as duas fases magnas do cíclo
cardíaco, sendo depois subdividas em outras subfases. Torna-se mandatório,
portanto, o entendimento desse funcionamento, uma vez que todo o racicínio
fisiopatológico e semiológico do exame cardiovascular se baseia na compreensão do
ciclo cardíaco.
A Origem do Estímulo
Antes de tudo, cabe uma breve revisão sobre a origem dessa contração
cardíaca. As células cardíacas tem a capacidade de gerar o seu próprio estímulo
(automatismo), que nasce no nó sinusal, percorrre um caminho pelo feixe de Bachman
feixes internodais até o nó atrioventricular, e daí para o feixe de Hiss e fibras de
Purkinje para estimular o músculo cardíaco e levar à contração do músculo cardíaco
gerando a sístole mecânica.
Sístole
A sístole é o período decorrido desde o fechamento das valvas
atrioventriculares (B1) até o fechamento das valvas semilunares (B2). É dividida em
fases de pré – ejeção e ejeção. A primeira é subdividida em Q – B1 e Contração
Isovolumétrica. A segunda é subdividida em Ejeção Rápida, Ejeção Lenta e
Protodiástole.
Q – B1
Portanto, a primeira fase é Q – B1, que corresponde ao tempo decorrido da
ativação elétrica ventricular até a contração mecânica desse mesmo ventrículo. Não
possui significado clínico, uma vez que não pode ser evidenciado à beira do leito, mas
se medido pode trazer informações à cerca de algumas patologias, por exempo: Q –
B1 diminuído está presente no bloqueio de ramo esquerdo e na estenose mitral.
Contração Isovolumétrica
Após a ativação e o início da contração, a pressão dentro do ventrículo começa
a subir e logo ultrapassa a pressão existente no átrio, ocasionando o fechamento da
valva atrioventricular. Nesse momento a pressão no ventrículo ainda é menor que
aquela registrada nos vasos da base, de forma que as valvas semilunares ainda estão
fechadas. Ao final da contração isovolumétrica a pressão dentro do ventrículo supera
aquela nos vasos da base e as valvas semilunares se abrem, dando início à ejeção so
sangue. Essa abertura das valvas aórtica e pulmonar normalmente não é audível, mas
em casos de valvas anatomicamente alteradas (Estenose aórtica ou pulmonar), podese ouvir um ruído de alta frequência chamado do click de ejeção nesse momento.
Então, a contração isovolumétrica é o período decorrido desde o fechamento das
valvas atrioventriculares até a abertura das valvas semilunares. Nessa fase ocorre o
maior gasto de ATP no ciclo, e gera-se um gradiente de pressão responsável pela
ejeção do sangue para a grande e pequena circulação.
Ejeção Rápida
Após a abertura das valvas semilunares, o sangue é rapidamente ejetado para
os vasos da base, reduzindo igualmente rápido o volume ventricular. Sabe-se que
cerca de 2/3 do volume diatólico final é lançado na circulação nessa fase.
Ejeção Lenta
O volume reduzido nos ventrículos leva à uma queda na pressão ventricular, ao
mesmo tempo em que a pressão dentro dos vasos da base aumenta pelo volume
crescente de sangue que é ejetado. Isso leva à uma queda na velocidade e na
quantidade de sangue que é ejetado, de modo que nessa fase, menos de 1/3 do
volume diastólico final é lançado na circulação.
Protodiástole
Nessa fase, os ventrículos já estão iniciando o seu relaxamento, de modo que
a pressão dentro dos mesmos pode se tornar até levemente menor que a pressão
dentro dos vasos da base. Contudo ainda existe um pequeno fluxo de sangue para
dentro desses vasos, isso se dá pelo impulso da massa de sangue que vinha sendo
ejetada e ainda possui energia suficiente para gerar um fluxo, por menor que seja. Ao
final da protodiástole a pressão dentro dos vasos da base é grande o suficiente para
fechar as valvas semilunares, e dessa maneira dar fim à sístole. O fechamento da
valva aórtica é representada na curva de pressão aórtica como um entalhe na mesma,
chamado de incisura dicrótica.
Diástole
A diástole é o período entendido entre o fechamento das valvas semilunares
(B2) até o fechamento das atrioventriculares (B1). É dividida em Relaxamento
Isovolumétrico e fase de Enchimento, que se subdivide em Rápido, Lento, e Ativo
(Contração Atrial).
Relaxamento Isovolumétrico
O ventrículo está agora em relaxamento, e com as valvas semilunares e
atrioventriculares fechadas. Nessa fase, a pressão dentro do ventrículo reduz
progressivamente, até o ponto em que se torna menor que a pressão dentro dos
átrios, causando a abertura das valvas atrioventriculares e a passagem de sangue
para a cavidade ventricular. Nessa fase, os átrios estão terminando de se encher de
sangue, o que é essencial para a garantia de um volume diatólico final adequado, e
consequentemente, de um débito cardíaco suficiente. Tambem nessa fase, cria-se um
gradiente de pressão entre os átrios e ventrículos, essencial para a sucção diatólica
dos mesmos. O tempo de relaxamento isovolumétrico (TRIV) é uma medida obtida
pelo ecocardiograma que pode expressar algumas alterações patológicas da função
cardíaca diastólica. Quando aumentado, expressa doença restritiva, como por
exemplo uma cardiomiopatia isquêmica. O TRIV dura até 90ms, sendo considerado
aumentado quando supera essa marca. Então, o relaxamento isovolumétrico é o
período que compreende o tempo desde o fechamento das valvas semilunares até a
abertura da valvas atrioventriculares. Essas mesmas são inaudíveis, em condições
normais. Contudo, quando anatomicamente alteradas (Estenose mitral ou tricúspide),
ausculta-se um ruído de alta frequência quando se abrem chamado de estalido de
abertura.
Enchimento Rápido
Com o relaxamento progressivo dos ventrículos e o enchimento dos átrios, a
pressão dentro destes últimos supera a aquela dentro da cavidade ventricular e as
valvas atrioventriculares se abrem. Na Ejeção rápida a maior parte do sangue dos
átrios passa para o ventrículo, cerca de 50%. Isso acontece por que o gradiente
pressórico átrio-ventrículo é muito grande. Normalmente, essa fase é silenciosa. Mas
quando um ventrículo dilatado recebe um volume de sangue maior do que o normal,
gera-se um impacto que dá origem à um som de baixa frequência chamado de terceira
bulha cardíaca (B3). Essa bulha acessória tambem pode estar presente
fisiologicamente em indivíduos jovens. Quando patológica, geralmente expressa
sobrecarga de volume do ventrículo afetado.
Enchimento Lento
Nessa fase, os ventrículos possuem maior volume e portanto maior pressão, de
modo a diminuir o gradiente pressórico átrio-ventrículo. Isso leva a uma menor
velocidade de enchimento ventricular. Somente 30% da capacidade dos ventrículos é
preenchida.
Enchimento Ativo (Contração Atrial)
Nesse momento os átrios são despolarizados e entram em sístole para
preencher os 20% restantes da capacidade ventricular. Pode-se observar um aumento
na curva de pressão e volume dos ventrículos, que vinham em uma medida constante
desde o enchimento lento. Normalmente, essa fase é silenciosa. Contudo, em alguns
indivíduos jovens normais e em algumas situações patológicas, a contração atrial
contra um ventriculo com pressão aumentada leva ao choque de um volume de
sangue contra as paredes desse ventrículo, gerando um som de baixa frequência
chamado de quarta bulha cardíaca (B4). Quando auscultada, a B4 geralmente indica
sobrecarga de pressão do ventrículo acometido. Após a contração atrial, ocorre o
estímulo e a contração do ventrículo, que entra em sístole novamente, reiniciando o
ciclo cardíaco.
A figura abaixo resume as curvas de pressão atrial, ventricular, aórtica, a curva de
volume ventricular, associando-as ao traçado eletrocardiográfico e às bulhas
cardíacas.
Bibliografia
•
Semiologia Cardiovascular; Couto, A., A.; Nani, E.; Mesquita, E., T.; Pinheiro,
L., A., F.; Filho, L., J., M., R.; Bruno, W.; editora Atheneu
•
Tratado de Semiologia Médica; Swartz, M., H.; editora Saunders elsevier
•
Tratado de Doenças Cardiovasculares; Braunwald; oitava edição; editora
Saunders elsevier
•
Medicina Interna; Harrison; décima sétima edição; editora Artmed
•
Semiologia Médica; Mário Lopes; terceira edição; editora Atheneu
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