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Os coleópteros do Parque Natural da Serra da Estrela (2000)

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Tribuna da Natureza, 3: 12.
Os coleópteros do Parque Natural da Serra da Estrela
José Manuel Grosso-Silva
Biólogo, estagiário do Parque Natural da Serra da Estrela
Os insectos são o grupo animal mais numeroso do planeta, conhecendo-se, actualmente, mais de um
milhão de espécies. O maior contributo para esta enorme diversidade é dado pela ordem dos coleópteros, que
inclui o que vulgarmente se designa por escaravelhos, cujo número de espécies conhecidas ultrapassa as
350.000.
Em Portugal, embora a Entomologia (a ciência que se dedica ao estudo dos insectos) se tenha centrado
nos coleópteros e nos lepidópteros (borboletas), em muitas zonas do país os conhecimentos são ainda
reduzidos, mesmo para esses grupos. Esta situação verifica-se na generalidade das Áreas Protegidas, em que
os conhecimentos, além de serem reduzidos, se baseiam, na maioria dos casos, em estudos antigos e pouco
especializados.
O Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE), situado na zona Centro-Este de Portugal, é a maior Área
Protegida do país e, devido à sua posição geográfica, à sua orografia e ao seu clima particulares, engloba
uma grande variedade de biótopos, que permite antever a presença de uma grande diversidade ao nível da
fauna de insectos, tal como se verifica, por exemplo, ao nível da flora.
Durante o ano de 1999 realizou-se um estudo nesta Área Protegida, em que se procurou recolher os
dados bibliográficos relativos à fauna de coleópteros. Paralelamente, efectuou-se trabalho de campo, com
vista à ampliação dos conhecimentos existentes. O levantamento bibliográfico efectuado permitiu a recolha
de informações relativas a mais de 850 espécies de coleópteros. O trabalho de campo realizado possibilitou,
além disso, a localização de cerca de 60 espécies novas para o Parque, sendo algumas de grande interesse,
quer por serem novas para Portugal, quer por serem pouco conhecidas a nível do país (uma delas, por
exemplo, é endémica da Península Ibérica, e só era conhecida de um local, em Portugal).
Verificou-se que a obra mais importante para o conhecimento dos coleópteros do PNSE é o
“Catalogue des insectes du Portugal. Coléoptères” (OLIVEIRA, 1894) no qual são citadas para a área do
Parque cerca de 520 espécies. Diversos trabalhos posteriores, nos quais foram citadas muitas espécies
inéditas para a área e confirmadas outras cuja presença era previsível, por se encontrarem referidas como
ocorrendo em todo o país, em todo o Norte, etc., contribuíram para a ampliação dos conhecimentos
Entre as espécies de coleópteros presentes no PNSE, muitas podem considerar-se interessantes, por
distintos motivos. Algumas espécies, por exemplo, foram descritas com base em exemplares colhidos na
área, tendo depois sido encontradas noutras zonas, como acontece com Abromus lusitanicus Dajoz, 1969, um
colidídeo originalmente colhido em Manteigas e posteriormente encontrado no Porto (DAJOZ, 1969, 1977).
Trata-se de um escaravelho de tamanho muito pequeno (o seu comprimento não ultrapassa 1,1 mm) e
desprovido de olhos, características que constituem adaptações à vida endógea (vida no interior do solo).
Outra espécie interessante é o carabídeo Oreocarabus pseudosteuarti (Lapouge, 1924) que só é conhecido
das Serras da Estrela, Buçaco e Lousã (ZABALLOS & JEANNE, 1994) tratando-se, por isso, de um
endemismo português.
Entre as espécies novas para Portugal, encontradas no decorrer do
estudo da fauna do Parque, mereçe destaque o silfídeo Necrodes
littoralis (Linnaeus, 1758) (figura). Esta espécie, cujo comprimento pode
exceder 2,5 cm, vive em cadáveres de animais, normalmente de grande
tamanho (cães, gado) e alimenta-se, principalmente, da sua massa
cerebral. Faz parte do grupo dos insectos necrófagos, cujo papel na
decomposição dos restos de animais mortos tem uma grande importância
nos ecossistemas terrestres. Além deste silfídeo, encontraram-se no
Parque várias outras espécies de necrófagos. Um facto curioso que se
observou, durante o mês de Maio, foi a ocorrência de pelo menos cinco
espécies diferentes de coleópteros necrófagos sobre um cadáver de
lagarto-de-água, três das quais ainda não eram conhecidas na zona, o que
revela que este tipo de fauna se encontra, ainda, muito mal estudado em
Necrodes littoralis (Linnaeus, 1758)
(adaptado de CHATENET, 1990).
Portugal.
Convém ainda referir que, apesar de o trabalho se ter centrado nos coleópteros, outros grupos foram
também alvo de alguma atenção como, por exemplo, os percevejos (ordem Heteroptera), de que se
conheciam no PNSE cerca de 170 espécies, às quais foi possível adicionar mais de uma dezena, e os grilos
(ordem Orthoptera, superfamília Grylloidea), de que se conheciam três espécies no Parque, a que se
acrescentaram outras três, uma das quais nova para Portugal.
Bibliografia
CHATENET, G., 1990 - Guide des coléoptères d’Europe. Delachaux & Niestlé, Neuchatel. 479 pp.
DAJOZ, R., 1969 - Révision des Colydiidae anophtalmes de la faune paléactique. II. - Notes
complémentaires sur les genres Anommatus et Abromus. Rev. Écol. Biol. Sol, 3 (3): 377-389.
DAJOZ, R., 1977 - Coléoptères Colydiidae et Anommatidae paléarctiques. Edit. Masson, Paris. 275 pp.
OLIVEIRA, M. P., 1894 - Catalogue des insectes du Portugal. Coléoptères. Coimbra. 393 pp.
ZABALLOS, J. P. & JEANNE, C., 1994 - Nuevo catalogo de los carabidos (Coleoptera) de la Península
Ibérica. Monografias S.E.A., 1. Saragoça. 159 pp.
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